24/03/2025

Arcano dezenove: Uma leitura poética do Tarô, por Renata Bomfim ( Maria Lúcia dal Farra)


Capa do Arcano Dezenove
 
O tratamento literário do Tarot, pelo menos a partir do século XIX, passa pelo seu próprio renovador: Eliphas Lévi. Contemporâneo de Baudelaire, o ex-Abade Constant é o autor de “Les correspondances”. Publicado em Les trois harmonies (1845), o poema entremostra similaridades de composição com o “Correspondances” de Baudelaire. O tipo de analogias praticadas em ambos é uma manifestação da tradição hermética e esotérica que, na altura, comparece, para os horizontes da literatura, como uma via alternativa de afronta e resistência aos discursos dominantes e às leis de consumo decorrentes do nascente capitalismo.
Composto mais ou menos na época que o de Constant, entre 1845 e 1846 (embora só publicado em 1857, no Les fleurs du mal), o poema de Baudelaire expõe, como o do Abade, a crença num simbolismo universal, em que tudo participa de tudo. Em ambos, a busca da unidade primordial é, portanto, notável¹ . Mas é em Dogme et Rituel de la Haute Magie (1855) que, pelas mãos de Lévi, o Tarot se atualiza inaugurando-se na chamada escola moderna. O (agora) Mago acrescenta, pois, à interpretação dos Arcanos (dos segredos e dos mistérios), a Cabala Hermética e certa contribuição da Alquimia: a simbologia dos quatro elementos.
No mesmo ano de publicação dessa obra, Gérard de Nerval, extraordinário e contumaz leitor do Ocultismo, e, por isso mesmo, decisivo escritor francês (divisor de águas entre o Romantismo e a Modernidade) se suicida. No ano anterior ele havia publicado o volume de sonetos Les chimères, que estampava “El desdichado”, poema nascido da leitura de uma carta do Tarot, a do Arcano 16, carta determinantemente premonitória do seu fim² . O Tarot mostrava, assim, a sua face divinatória à literatura. Mas o compêndio simbólico-oracular, em que o Tarot também fora se transformado ao longo do tempo, exporá, depois, o seu sortilégio, na promessa que Nerval firmara ainda naquela obra: malgrado a morte, ele retornaria.
Se a “torre derrubada” e a “destruição”, contidas no dito Arcano, esculpiram, para o escritor francês, o seu destino pessoal, André Breton tomará para si, quase cem anos mais tarde (entre 1944 e 1947), a missão de rediviver o estimado escritor e comparsa esotérico. Em Arcano 17, Breton elege tal carta como objeto da última de suas obras em prosa - justo o Arcano que promete o prodígio do renascimento. A tetralogia em prosa de Breton tivera início em 1928, com Nadja, seguida de Les vases communicants (em 1932), de L´amour fou (em 1937), culminando, dez anos depois, com o Arcane 17. Desde Nadja, entretanto, Nerval pulsa na obra de Breton, e agora, em 1947, ele toma definitivamente lugar nela.
Lançando como seu guia a “Estrela da Manhã”, Breton conserva a perspectiva hermética da tradição literária incrementada pelo compatriota, simbolicamente explicitada na tomada do Arcano seguinte ao manipulado por Nerval; Breton trata, pois, da carta redentora. É dessa maneira que o surrealista ritualiza o regresso de Nerval – o seu retorno prometido. A “Estrela” é indício de nascimento, de esperança no futuro, de conhecimento e gnose, de luz; luz que se exerce por meio de três vias: a poesia, a liberdade e o amor, apanágios dessa marcante obra de 1947³ .
Creio que é nessa linhagem que cabe inserir o presente livro de poemas de Renata Bonfim, Arcano Dezenove 4 , visto que, além do mais, ele é todo armado sobre o tripé das mesmas palavras de ordem de Breton: poesia, liberdade, amor. Se, da sua parte, se trata ou não de determinação consciente, sequer importa; o célebre “acaso objetivo” surrealista é para mim suficiente para justificar tais curto-circuitos da analogia, essa rede de ecos que, sob a descontinuidade, é capaz de descortinar uma outra ordem que, ocultamente, lhe dá sentido e seguimento. E esse me parece ser deveras o caso.
Se o livro de Renata tem por título o Arcano 19, a primeira ansiedade (na sequência da minha cogitação) seria a de tentar entender o salto do dezessete bretoniano para o dezenove bomfiniano. Por que Renata, para chegar ao dezenove, não passa pelo Arcano intermediário?
Pra já, se nos ocupamos do Tarot, temos de tomar como ponto de partida a Lâmina do baralho, de suma importância para a decodificação simbólica - primeira riqueza especulativa para o ingresso no jogo que é, como se sabe, nem um pouco linear. Cada carta só adquire real valor na disposição em que se encontra no contexto de outras tantas: como as palavras, como a língua (também objeto do livro de Renata), seu significado é absolutamente relativo, ganhando força e convicção na medida em que entretém, com as outras cartas, laços de atração e repulsa que formulam a sua própria linguagem, o discurso da vez - o que enuncia a jogada atual, a tiragem do acaso.
Pois não é que o volume de Renata, que tem por título o arcano seguinte, ostenta, como sua apresentação e cobertura, o arcano anterior? Melhor dizendo: não é que o volume de Renata, que anuncia o Arcano 19, se expõe como uma decisão interpretativa do Arcano 18?
A capa de Arcano Dezenove estampa, como constato, a Lâmina que resulta da leitura que a consulente (diante de um cenário eventual de cartas ligadas por tais parentescos conflituosos e harmônicos) elaborou do Arcano anterior. É ao desvendamento pessoal do Arcano 18 que a capa do presente Arcano Dezenove faz alusão - ou melhor dizendo: é essa chave, essa decifração, que o invólucro do livro definitivamente espelha. O que faz com que, ali mesmo (e por antecipação, já que a posição da Lâmina nos é frontal), o 18 conviva com o 19 - como pressuposto para a leitura do volume que o receptor desvelará ao virar a primeira página: como condição mesma para a travessia dele.
É como se, para entrarmos no domínio do que a cobertura do livro anuncia ao cimo, ou seja, para conhecermos esse território do Arcano 19, tivéssemos necessariamente de entender as circunstâncias impostas, pela sua autora, à carta anterior. De maneira que a capa se exibe enquanto pórtico, enquanto senha - como um código para o compartilhamento daquilo que o livro de poemas enfeixa.
Tento ler, portanto, o recorte que essa ilustração de entrada faz sobre a Lâmina 18. A “Lua”, indecisa entre a face máscula e a fêmea, põe a tônica sobre a mulher, sem desvencilhá-la do seu lado noturno, presente nas suas vestes mas quebrado pelo aspecto positivo indicado no arminho que desliza da consulente (e da Figura) para o chão, para a terra - para o ouro alquímico 5 . Os dois cães, ou o cão e o lobo da lâmina original estão confluídos e catalisados no cachorro de duas cores que essa mulher dubiamente domina e acaricia, posse sua e agente ou guia seus. Na capa, a única torre erguida no cenário é a da vegetação, coluna de rosas, uma vertical corbeille vermelha (versão das várias plantas que compõem a carta referencial), que faz pendant com a cortina de veludo, de igual tonalidade e quentura erótica, e que salpica (ampliando os matizes) o cabelo da Figura. O escorpião não está à mostra, mas sabê-lo imerso no vaso hermético (no Vaso de Hermes) da poetisa: é o seu signo astrológico.
A Lâmina que a capa compõe é toda luz e sombra, magia branca e negra, incerteza melíflua: basta reparar no sorriso ambíguo da Figura (ou da consulente – a luz da “Lua” é reflexiva, e, portanto, as duas mulheres refletem a mesma: a poetisa) que, dessa forma, disfarça a luta que se trava entre as forças tenebrosas, entre a porta do Inferno e a do Céu (conforme o solstício seja do inverno ou do verão), entre a Lua e o Sol – “Sol” que anuncia o Arcano que nomeia o livro.
A Lâmina explicita, portanto, essa caçadora celeste, essa divindade lunar (Artemisa, Diana, Hécate) – imagem que se aglutinará durante a leitura do livro, graças mesmo a esse simbolismo de trânsito, de passagem, de viagem heróica que o Arcano 18 encerra. Do plano iniciático da via úmida lunar nascerá a Feiticeira, a Maga e a Poetisa que, viajando em corpo etéreo (o “corpo cósmico” tão referido no volume) da Noite para o Dia, da Luz Noturna para a Luz Solar que o Arcano 19 encerra, buscará despertar, com suas palavras, aquilo que dorme. Aliando-se ao Sol, ao Fogo Criador e à Pedra Filosofal próprias do Arcano 19, a Poetisa procurará representar o Centro da Consciência capaz de abranger e dar voz ao Universo.
É sob o sortilégio dessa Lâmina que passo a ler os poemas de Renata Bomfim, que se dividem em sessenta e um organizados em torno de cinco seções: “Arcano Dezenove”, “Memória”, “Quintessência”, “Onde os tempos se encontram” e “Rituais”.
No primeiro, a predominância da metalinguagem é palpável: interessa especular sobre o papel do poeta, da letra, da poesia, da escrita e da sua missão, enfim, sobre os milagres da palavra. O mundo é visto como manifestação lingüística e permanente festa (“Dionísio”) e a poesia, “palavra/dando cria” (“Poesia I”), compreende milhares de existências simultâneas, aquilo que é comum e é diverso, lugar onde triunfa a palavra insurrecta, espaço oculto, messiânico, árvore que deve brotar por todo o canto.
Acerca da poesia, portanto, o processo de mutação do estranho e distante em componente familiar e doméstico (a poesia se encontra, afinal, em sua Casa) é obtido por um regime de deglutição, exposto com muita graça e ironia neste pequeno poema intitulado “Poesia II”:

O grego e o latim
encharcam a minha língua
com veneno,
produzindo a poesia
que desce redondilha
garganta abaixo. (p.30)

Veja-se que o nobre e o alto (o “grego” e o “latim”), pressentidos enquanto “veneno” para a “língua” (esse órgão de degustação), uma vez assimilados pela “garganta” que os vai emitir a fim de transformá-los em “poesia” - resultam em “redondilha”, ou seja, na justa medida do... feminino. Assim, é de se convir, que a poética daí criada (e derivada das línguas primordiais do português) é popular, buscando apresentar uma outra versão das formas ilustres (certamente pertenças do mundo masculino). Estas, uma vez ingeridas forçadamente (visto que descem redondas garganta abaixo – e esse é o trocadilho com o qual o poema brinca), acabam alterando por inteiro a forma com que foram impostas à garganta. A “redondilha” torna-se, portanto, uma conquista particular da Poetisa.
Todavia, homem ou mulher (Ruben Dario e Florbela são o casal guardião dessa poesia), o poeta está sempre à mercê de tudo. É muitos e ninguém, é tudo e nada, é um paradoxo; alimenta-se de si e dos outros, é um ser que se perpetua através dos tempos, que se encarna em alheios, em busca do mistério da outridade. Assim, a letra é concebida como a Eva primordial, cuja pena é, na verdade, a palavra escrita, em seu trabalho de nomeação e perpetuação do mundo. Eis como o “Poeta Adâmico” cogita tal origem:

No paraíso da linguagem,
O poeta, com desvelo,
Inclina-se para amar a letra.
Nesse momento, ele é Adão,
Ansiando companhia, à espera
De que a fêmea se submeta.
Cometidos os pecados,
Do outro lado, a pena:
“Ganharás o pão com trabalho,
Com o suor de tuas mãos,
E também, com teus pulmões,
Rins, fígado e coração”.
O homem se pega em desatino,
A sua vida será labor e sacrifício,
Mas estava escrito:
Havia de ser assim
Para que pudesse seguir nomeando
As coisas e povoando a terra
Com Abéis e Cains. (p.20)

Na segunda parte de Arcano Dezenove, é a condição feminina e a biografia literária que assumem o primeiro plano. A tonalidade mística, que já se manifestara em “Nossa Senhora dos Raios Multicoloridos”, da primeira seção, reaparece aqui em “Saturnais: mito de origem”, e depois retornará abertamente em “Gente da Era da Luz”, poemas em que o Sol é reverenciado, como cabe ao Arcano que nomeia o livro e que, aliás, já havia transmutado a Poetisa no seu “cálice”, tornando-a depositária de todas as coisas diante de “um sol de sétima grandeza” (“Arcano Dezenove”). Tais poemas tendem a explicitar, assim, o ponto-de-vista do qual emana a crítica (a dita Consciência concernente ao referido Arcano) aos destemperos da atualidade, à destruição do planeta, que peças como “Guernica Hoje”, “Tara moderna”, “Humanóide”, “Eu Canto a Pátria-Planeta”, “Terra Santa”, etc, exercem.
É deste naipe a bandeira ecológica da Poetisa, batalha socioambiental que ganha fortes raízes do misticismo oriental, que transparecerão, em seguida, em poemas como “Cristo Cósmico”, “Terra Santa”, “Prece”, “Terra”, “Semear”, etc. Veremos, em seguida, de que maneira esta temática se entrelaça com o feminino para adensar a imagem de mulher, a que a Lâmina faz referência.
A condição feminina, que se ampara em Florbela Espanca (em poemas diretamente afeitos à portuguesa ou que implicitamente passam por sua obra), é identificada como “Cicatriz” – nome da peça que inaugura essa “Memória“. Mas esse gênero também fica apontado na imagem daquela que se faz acompanhar do gato, animal que é perfeição, que é a letra chet (“Gato”), letra cujo desenho encerra a Casa cerrada (aberta somente por baixo), felino cuja falta, no momento da partida, torna os “poemas encharcados” (“Despedida”) e faz da Poetisa apenas a sua “humana de estimação” (“Gato Rei”).
Feiticeira, essa mulher é também telúrica, é vegetal (“Orgânica”), é natureza: pedra, água, planta, paz, solidariedade, novo tempo – lugar onde o saber, ao contrário do Éden, jamais será proibido (“Não Materialidade”). Por tudo isso, a poesia de Renata se apresenta como uma das maneiras de resgatar aquelas mulheres que foram silenciadas pelo tempo (é o que nos assegura o poema “Brutal Singeleza”, de “Quintessência”), procedendo, assim, a uma espécie de justiça poética. De maneira que também as prostitutas têm aqui voz (“Há Vagas”). Em “Humanidade Nata” (de “Onde os tempos se encontram”, a quarta parte do livro), o buraco aberto no tempo e no espaço, pela flauta que soa, permite que a Poetisa viaje nas asas do vento, numa espécie de transmigração, e se torne muitos, “Ulisses nos braços de Circe”,

Eva cantando triste
(desejosa) pela fruta de que tanto gosta.
Ah! Se eu pudesse beber do Letes
e ser inaugural como a alvorada,
ser Divina,
e não essa fêmea bruta,
mulher em construção,
alterada
e mesquinha
trazendo a humanidade nata. (p.77)

O desejo de conter em si essa “humanidade”, ato simbólico do Arcano 19, lhe dá a sensação e a certeza de que “somos flechas,/mirando o infinito.” (p.78). Mas, para tal, será preciso “libertar a borboleta aprisionada”, buscar a luz que ainda não se conheceu – muito embora tais anseios não sejam senão sonhos (“Efeito Borboleta”).
De resto, a mulher é ao mesmo tempo aquela que, morta, retorna ao lugar de onde veio (“Post Mortem I”), que prefere o inferno à sujeição, e que não abdica da irreverência: a Poetisa importa-se apenas com o risco de não arriscar (“Poema Inacabado”). Fala-se então daquela cujos pés e mãos constroem o seu próprio buraco (“Versos de Orgulho e Solidão”), irreverência e marotice ainda ilustradas pela imagem da não-convencional, daquela que confessa abertamente o quanto aprecia fazer “uma cena” (Post mortem II)...
A sublinhada erótica, já entrevista na Figura da Lâmina da capa deste livro de poemas, está em tudo e mais acintosamente em “A Fúria de Eros” e em “Antes do Éden”, respectivamente de “Quintessência” e de “Onde os tempos se encontram”, terceira e quarta partes da obra. Em “Carnaval” (de “Quintessência”), o corpo fica autorizado e a mulher se entrega à orgia, sendo quem não é; e a carne é santa e “vibra e goza até o pranto”. O Carnaval se revela, então, uma forma coletiva de existir. Por fim, é na derradeira secção, em “Rituais”, que a Maga, a Feiticeira e a Poetisa se mostram contraditoriamente una e plural. É ali também que a defensora do planeta, a erótica e a mística se consubstanciam num “Transluzir” – numa “aquarela”:

O que fui, sou e serei
Aquarela! (p. 61)

É nos rituais que as mensagens poéticas se tornam mais palpáveis – e mais úteis! – e é neles que, por meio do preceito, são transferidas aos leitores. As infusões, os encantamentos, os patuás, os filtros para o amor e para a liberdade universal, salvaguardando sempre o respeito à natureza (sequer a erva daninha pode ser arrancada; a poesia é vegetal), misturam curiosidades, em torno de plantas, com receitas certeiras para curar dores, acordar espíritos, lançar bênçãos e... “olhares de secar pimenteira” (“Desejos de Feiticeira”). Eis onde a vegetação do Arcano 18 encontra a sua síntese e desemboca na peleja ecológica. “É preciso coragem para abraçar/o inesperado”, para pluralizar - é o que nos ensina, por exemplo, a “Cerimônia do Chá”. Dúbia, hesitante entre a treva e a luz, entre o Arcano 18 e o 19, entre a “afasia” e o “estro”, entre espalhar imprecações ou bênçãos, a Poetisa descobre – e nos ensina! - que há “uma fissura” por onde o tempo espia. Afinal, a “alma”, essa dádiva de Luz do Arcano 19, só na arte se encontra (“Entre a Luz e a Escuridão”)!
Notas:
1 A propósito, remeto o leitor a dois textos meus que apreciam essa questão: “Anotações de uma bibliógrafa: Baudelaire e o esoterismo” (Remate de Males. Campinas: Unicamp/IEL, 1984), e “Surrealismo e esoterismo: a alquimia da poesia”. (O Surrealismo (org. Jacob Guinsburg e Sheila Leirner). São Paulo: Perspectiva, 2008).
2 Não esquecer que Julia Kristeva consagra um capítulo a Nerval em sua obra Sol negro – depressão e melancolia (Rio de Janeiro: Rocco, 1989, trad. Carlota Gomes), título que, aliás, toma emprestado ao poema em questão.
3 Claudio Willer refere esta retomada esotérico-literária da parte de Breton, num texto publicado no número 59 de Agulha. Revista de Cultura, de setembro/outubro de 2007, intitulado “André Breton, Nadja e Gérard de Nerval: estranhas relações”. A propósito, leia-se também sua elucidativa e extraordinária obra Um obscuro encanto. Gnose, gnosticismo e poesia moderna (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010)
4 BOMFIM, Renata - Arcano Dezenove .Vitória: Flor&Cultura Editora, 2011, 100 páginas.
5 Não esquecer que o modelo que compõe a referida Lâmina congrega, numa só, a consulente e a Figura do Arcano, ou seja: aquela que consulta e a que é consultada que, por fim, são a mesma, visto que é a imagem da poetisa a que a capa ostenta.
 


Maria Lúcia Dal Farra é poeta, critica literária,
e professora de Literatura da UFSE.
Autora da obra o narrador ensimesmado e
Ganhadora do Jabuti de Poesia 2013

ARCANO DEZENOVE; o cosmos poético de Renata Bomfim por Francis Kurkievicz*

Arcano Dezenove, publicado em 2010 pela Helvética Produções Gráficas e Editora, é a segunda obra da poetisa capixaba Renata Bonfim, um marco de sua que sucede o bem-recebido Mina. Com 98 páginas, o livro se estrutura em temáticas – Arcano Dezenove, Memória, Quintessência; Transição e Rituais– e revela uma voz poética madura, que entrelaça lirismo, espiritualidade e um grito urgente pela preservação ambiental. Não é apenas poesia; é um manifesto existencial que ressoa no cenário literário brasileiro contemporâneo, especialmente por sua perspectiva feminina e cósmica. Renata, doutora em Educação e artista multifacetada (como revela seu blog Letra e Fel), construiu aqui um labirinto de palavras-imagens que convida o leitor a mergulhar na essência da vida e da arte.

A obra pulsa com temas que transitam entre o íntimo e o universal. Em Terra Santa, a poeta lamenta: Terra Santa / bendita, / adorada / O que fizemos com você? / Tua dor me trespassa, um apelo ecológico que ecoa a destruição ambiental com uma sensibilidade visceral. Já Jesus Cósmico expande a espiritualidade para além do dogma, com versos como: Não sou alegre nem triste, apenas sou! indicando uma comunhão mística entre o eu e o universo. 

A feminilidade, por sua vez, brilha em Orgânica: A mulher era verde / E sem veneno, aconteceu uma vez da força natural e transformadora da mulher. A metalinguagem também é recorrente, como em Poemas: As letras que, a duras penas, saltam dos dedos para o papel /condensam vozes, revelando a poesia como um ato de luta e libertação. 

Estilisticamente, Renata Bonfim combina versos livres com imagens sensoriais potentes, como em Arcano Dezenove: Inunda a minh’alma um sol de sétima grandeza / e te desejo toda, inteira, / Terra amada, Santa, Natureza! A intertextualidade enriquece a obra, dialogando com Bakhtin (As letras [...] condensam vozes, e Calvino (Quem somos nós [...] se não uma combinatória de experiências?), sem soar pedante.

 Há uma simplicidade erudita que convida à reflexão, embora alguns poemas, como? com sua densidade histórica (Será que a poesia do século XVI era minha?), pode desafiar leitores menos acostumados ao simbolismo. Ainda assim, a força reside na capacidade de transformar o complexo em acessível, como em Despertar: Desperta! / Acorda pleno e sente / És letra! um chamado à consciência poética e humana.

 O diálogo com outros poetas é um dos pilares do Arcano Dezenove. Rubén Darío, o modernista nicaraguense, é invocado em Canção para Rubén Darío: Poeta do Azul, quem te cantará? / [...] A América te cantará! um tributo que resgata sua sensualidade paga e a adaptação à América Latina contemporânea de Renata. Florbela Espanca, a poeta portuguesa do desejo e da melancolia, ecoa em Florbela em canto: No claustro, o silêncio ensurdece. / Fado? A alma resiste e canta, uma homenagem que reflete a intensidade emocional partilhada por ambos. Cecília Meireles, com sua leveza metafísica, aparece sutilmente em Jesus Cósmico, remetendo à busca pelo transcendente em Cântico VI de Meireles. 

Renata não imita; ela conversa com esses gigantes, trazendo sua própria voz – mais terrena, mais ativista – para o diálogo, como em Guernica Hoje: Dor dentro e fora do tempo que me atinge e te atinge, / e fingimos que não a temos. 

O impacto de “Arcano Dezenove” reside em sua capacidade de provocar e acolher uma obra que exige releitura, pois cada verso revelou novos sentidos, como: Estou nua, sim! / E disponível para tudo o que, / a partir de agora, / Venha acontecer; (Arcano Dezenove), que sintetiza a entrega da poeta ao mundo e à poesia. 

O posfácio de Fábio Mário da Silva destaca essa abertura: A obra não como objeto acabado e definido, mas [...] de abertura a várias possibilidades. No contexto brasileiro, onde a poesia feminina ainda luta por visibilidade, Renata emerge como uma voz necessária, alinhada às contemporâneas como Ana Martins Marques, mas com um tom distintamente místico e ecológico. 

Para o leitor latino-americano, ela oferece uma ponte entre o lirismo modernista de Darío e as urgências do século XXI. Arcano Dezenove é, enfim, um convite à resistência e à contemplação. Renata Bomfim nos guia por um cosmos poético onde a Terra chora, a alma canta e a mulher se ergue. Recomendo a leitura com o coração aberto, para que se ouça o eco de: Que nasça essa gente bendita. / Que rebentem novas sensações, uma prece por um futuro mais vivo e consciente.


*Francis Kurkievicz é poeta, escritor e professor, natural de Paranaguá/PR. Residiu por 20 anos em Curitiba/PR onde estudou FILOSOFIA – UFPR/2002, com especialização em Yoga – UNIBEM/2010 e MBA em Produção de RTVC, UTP/2011. Foi um dos 36 pré-selecionados ao Prêmio SESC de Literatura de 2015 na categoria Conto. Publicou, em dezembro de 2020, pela Editora Patuá, o livro de poemas B869.1 k96. Têm poemas publicados nas Revistas Acrobata, Hiedra, Mallarmatgens, Arara, Estrofe e no site escritas.org – traduções na Revista Zunái, Escamandro, Letra & Fel – artigos no Jornal Memai. Em 2022 teve seus poemas publicados nas duas maiores antologias mundiais de poesia: World Poetry Tree, organizado por Adel Khosan – Dubai/EA, e Living Anthology of Writers of the World, organizado por Margarita Al – Russia; também teve seu poema CHILDHOOD IN BHARAT publicado em MA: Antologia de Poemas em Memória da Poeta bengali Kazi Masuda Saleh, feito realizado pelo poeta de Bangladesh Abu Zubier Mohammed Mirtillah, Editor e organizado. Em Vitória desde fevereiro de 2012, ministrando oficinas de Dramaturgia, Haikai e Meditação.

21/03/2025

Renata Bomfim e sua poesia fêmea (Anaximandro Amorim)



Renata Bomfim (Vitória/ES, 21 de novembro de 1972) é poetisa, professora, educadora ambiental e doutora em estudos literários pela Universidade Federal do Espírito Santo. Membro da Academia Feminina Espírito-santense de Letras, tendo, também, presidido a instituição e organizado uma das edições da Feira Literária Capixaba (a Flic-ES), Bomfim é autora de quatro livros, todos recolhos poéticos. O coração da Medusa (2021), seu mais recente trabalho, é um volume de 157 páginas, editado com recursos da Secretaria de Cultura do Espírito Santo (Secult/ES) e apoio do Funcultura, Fundo Estadual de Cultura. O livro é bilíngue (português/espanhol) e a tradução é assinada pelo prestigioso escritor e crítico literário espanhol Pedro Sevylla de Juana, membro correspondente da Academia Espírito-santense de Letras.

O coração da Medusa possui três partes: 1) “Canto iniciático”; 2) “Queda”; e 3) “Ascensão”. Há também uma quarta parte, “Outros poemas”, mas, segundo a própria autora, “[O]s poemas que se seguem vieram à luz um tempo depois de finalizado O coração de Medusa. A decisão de incluí-los no poemário deve ao fato de eu sentir, ainda, ressoar a voz serpentina de Górgona nesses versos”, no que achamos, portanto, que o núcleo da obra se concentra nos três primeiros capítulos.

 O livro tem, como fio condutor, o mitema (grosso modo, a representação/consubstanciação do mito) da Medusa (“Górgona”), ainda que Bomfim explore, também, outras alegorias, como a bíblica (“O prazer de Salomé”) e a indígena (“Ritual tupiniquim”). Trata-se de um bem estruturado poemário, cujo erotismo tem uma tônica singular como forma de posicionamento da própria autora, numa poesia que, ousamos afirmar, vai além do feminismo, consubstanciando-se em uma “poesia fêmea”.

Expliquemo-nos: primeiramente, o mitema da “Medusa”, tão popular, leva em consideração não apenas aspectos do próprio mito, mas, também, uma provocação. Medusa era uma bela sacerdotisa que, ao se deitar com Poseidon no templo de Atena, foi transformada por essa em uma horrenda criatura, com cabelos de serpente e o condão de transformar em pedra quem ousasse cruzar seu olhar. Ela é o arquétipo da maldição, alguém condenada por ousar o amor e, mais ainda, ousar o prazer.

Há, portanto, várias “Medusas” na História, mulheres que foram além das convenções, mas que pagaram com suas vidas, sendo tidas como bruxas, prostitutas, proscritas. Nota-se, no entanto, que a Medusa de Bomfim possui um coração, o que leva a um paradoxo interessante, visto que o órgão, em literatura, tradicionalmente, representa o amor. Sim, Medusa também tem coração e, se tantas mulheres foram tidas como monstros, não seria por elas terem ousado pôr o sentimento em lugar de uma razão proveniente de uma sociedade de papeis preestabelecidos? Não seriam por terem ousado ser como elas realmente queriam ser?  

“Medusa” é o preço que uma mulher paga na nossa sociedade machista e falocêntrica. Bomfim, todavia, faz de seu livro um canto contrário a esse estado de coisas, o que já se percebe, num leitor mais atento, quanto ao conteúdo do livro, com a proposital mudança entre os vocábulos “queda” e “ascensão”. Começo, porém, por “Canto iniciático”. O vocábulo “canto”, aliás, é bastante encontradiço na obra. A mulher, sempre tida como “perigosa”, seduzia por seu canto. Muitos monstros mitológicos, como a Medusa, tinham formas femininas. Lembro-me de outro mitema, o das sereias, que entorpeciam os homens com seu canto. Ulisses só escapa da “maldição” pois estava amarrado a um mastro. O mesmo canto que seduz também pode levar à guerra. Renata canta a bravura de tantas mulheres, alijadas pelo cânone histórico e social. Por isso a inversão: se a mulher, que nos primórdios, era o cume da sociedade matriarcal, foi destronada pelo patriarcado, a poeta, no seu “canto iniciático”, quer dar voz a uma nova ascensão para as tantas Medusas da História.

O poema que dá título ao livro está, justamente, no capítulo deste “canto iniciático”, como uma preparação para um porvir. É ele:

O coração da Medusa

O coração da Medusa
(forjado em lada, cheio de fúria)
ama aquele que a busca.
A diva serpentina oferece
ao macho que penetra
na senda úmida e obtusa,
(caverna iniciática):
sedução, prazer, e gozo.
Até o momento fatal
da mirada suave e íntima,
o tempo para. A virgem
quebra o silêncio sepulcral,
chacoalha o guizo,
mas, ninguém testemunha
o milagre dos milagres:
A volúpia eternizada
numa estátua de carrara.

São 17 versos livres e brancos, em que Renata lança mão de uma inteligente proposta: usar um erotismo fino e elegante como fio condutor. É neste aspecto que ousamos classificar o livro não dentro de um viés apenas feminino ou feminista. Para nós, a obra de Bomfim ultrapassa esses conceitos, mostrando-se uma “poesia fêmea”: marcando territórios, ainda hoje, dominados pelo masculino, a autora expressa em versos o corpo da mulher, junto de sensações que, em muito, deságuam em um tema tão tabu: o prazer feminino. Nesta senda, ela se une a autoras como Gilka Machado, Cecília Meireilles, Julia Lopes de Almeida, Haydée Nicolussi e tantas outras que “cantaram” o feminino, o corpo, suas idiossincrasias, seu espaço e, principalmente, seu direito.

O poema em epígrafe esbanja essa sensualidade, com arquétipos que aludem tanto ao genital feminino (“caverna iniciática”) quanto ao masculino (com o uso do verbo “penetrar”). Há, também, uma alegoria que vai se repetir em muitos textos do livro, a da serpente, como imagem do pecado, do proibido e, em última análise, da própria mulher, como ser “perigoso”, que pode “seduzir” e “perverter” o homem. O gozo, esta petite mort, representado pelo chacoalhar do guizo, é o prenúncio de um milagre: Medusa também tem coração, também sente prazer, isto é: à mulher também é outorgado esse direito.

Ainda sob alegorias ofídicas, a segunda parte trás o poema “A víbora”. Há de se lembrar, entrementes, que este capítulo, intitulado “Queda”, alude ao rasteiro, ao chão, sobre o qual rasteja a serpente:

A víbora

A víbora que faz Eurídice dormir
ronda a minha cama,
Se acerca em arabescos
Aguardando o momento
do bote preciso, prefeito.
No instante apoteótico
do sonho,
Ela crava os dentes
no meu seio.

Nem Cleópatra experimentou
tamanha delícia.

Há, aqui, mais uma alegoria mítica: a de Eurídice que, morta por uma serpente, desce ao Hades, sendo resgatada de lá a súplicas de Orfeu, seu marido, filho da musa Calíope e do deus Apolo. Orfeu desobedece aos deuses, olha sua amada antes de chegar ao lar e é condenado ao Hades, o que significa: a víbora, aqui, mais uma vez, é o desejo pelo proibido. Se lembrarmos, também, Freud, pode ser a pulsão pela morte, mais uma vez, alegoria do gozo. Há toda uma sensualidade aí: a víbora ronda a cama, serpenteia. Ela pode ser, também, um arquétipo da genitália masculina. Ela crava seus dentes no seio feminino, podendo, também, ser representado pelo corpo. É um “instante apoteótico”, orgásmico, epifânico, um lapso antes da expulsão do jardim das delícias como “Nem Cleópatra experimentou”.

Do terceiro capítulo, “Ascensão”, colhemos este:

Ritual Tupiniquim

A praia recebe do mar
Homens errantes e exaustos.
Recolhidos pelas guerreiras,
Os corações são postos ao sol para secar.

Enquanto elas cantam e dançam,
eles cintilam, pulsam, ardem,
sentem desejo. As carnes quentes
encontram peitos receptivos,
se abrigam e brotam...
A coisa geminada vira gente.

É importante notar que a autora, além de literata, é ambientalista, e também engajada nas causas indígenas. Não é a primeira vez que Renata Bomfim se utiliza dessa temática, colocada neste poema, cremos, como chancela ao capítulo: mais uma vez, ritual. O rito, o canto iniciático, a guerra, tudo tão presente na obra, tudo tão, aparentemente, caro ao masculino, é transportado para o universo feminino. Aqui, podemos pensar, em termo de mitemas, às amazonas. Elas são, porém, “tupiniquins”, ou seja, o poema traz, também, elementos de brasilidade, como uma ode à força da mulher brasileira, latino-americana, mestiça.

É interessante notar, justamente, essa alteridade: os homens estavam “errantes e exaustos”; eles são “recolhidos pelas guerreiras”; o coração deles é “posto ao sol para secar”. Há uma clara inversão de lugares comuns, como o sexo masculino como o mais forte, por exemplo. Os corações postos ao sol aludem a um canibalismo e a dança das mulheres, sempre sensual, nos remete a um ritual de antropofagia que, em um sentido figurado, subverte o sentido: não são os homens que comem as mulheres, mas as mulheres que comem os homens.

O fim, portanto, será o milagre da vida: “a coisa germinada vira gente”, ou seja, a mulher, aqui, não é apenas uma imagem de força, mas, também, como um campo fértil que abriga a semente masculina. Ela é um ser dotado para ser vida e gerar, também, outra vida.

Anaximandro Amorim é membro da Academia Espírito-santense de Letras e mestrando em Estudos Literários – UFES.


11/02/2025

Terapia narrativa: histórias e contra-histórias de resistência (Renata Bomfim)


A Terapia Narrativa é uma modalidade terapêutica criada por Michael White e David Epston na década de 1980, e enfoca como a linguagem, as histórias e os significados atribuídos aos acontecimentos moldam a identidade e os comportamentos dos indivíduos.

 A Terapia Narrativa é uma abordagem terapêutica que considera que as pessoas interpretam e dão sentido às suas vidas por meio de histórias ou narrativas que constroem sobre si mesmas, suas experiências e o mundo ao seu redor. Essa abordagem terapêutica visa ajudar o indivíduo a reescrever suas histórias pessoais de maneira mais empoderada, com maior senso de controle e agência sobre sua própria vida. A ideia central é que, ao alterar a maneira como uma pessoa narra sua própria história, ela pode modificar a forma como lida com os desafios, os conflitos e até mesmo os problemas emocionais. Essa prática percorre um circuito que passa pelo desafio da história dominante saturada de problema até a construção de uma história alternativa, preferida pelo cliente. 

As histórias narradas pelo indivíduo estão sujeitas a mudanças e essa plasticidade da linguagem pode ser um caminho para a pessoa moldar novas formas de perceber o problema com vistas a encontra formas de lidar com o mesmo. Esse papel central da linguagem deve ao fato de ser por meio desta que contamos o indivíduo conta sobre si, fala de suas experiências. Para Michael White e David Epston, as pessoas não são definidas por problemas. As histórias, nesse contexto, servem como ferramentas de organização da experiência. Às histórias trazidas pelo indivíduo, saturadas de problemas,  se contrapõem narrativas de resistência, contra-histórias, que passam a sobrepor as narrativas dominantes, geralmente alicerçadas culturalmente no sistema sociocultural e político na qual a pessoa se desenvolveu e vive. Narrativas alternativas surgem como um ato de resistência a uma história dominante ou problemática. Essa abordagem confere ao analisando um lugar de protagonista do seu processo terapêutico, o especialista, de quem o terapeuta é um acompanhante privilegiado, um apoiador. 

Renata Bomfim 


 

03/02/2025

Dia Nacional das RPPNs no Espírito Santo (2025)/ As RPPNs no enfrentamento à crise climática (Renata Bomfim)

 

Assista Sessão solene em homenagem as RPPNs. 

No dia 31 de janeiro de 2025, a parceria entre o Instituto Ambiental Reluz e a Câmara Municipal de Marechal Floriano promover uma noite de diálogo entre os RPPNistas e o poder público. A Câmara Municipal de Marechal Floriano promoveu uma sessão solene em celebração ao Dia Nacional das RPPNs que contou com a presença de representantes da Câmara, do IEMA, da Polícia Militar Ambiental, da Secretaria municipal. Além das RPPNs já existentes no município, foram homenageados proprietários que estão em processo de criação de novas RPPNs no município. Tivemos a presença do Sr. LIz Mill que é RPPNista em Domingos Martins, município vizinho, mas que está também, planejando criar outra RPPN em Marechal Floriano.
 

Desde que a data foi instituída, em 2017, a RPPN Reluz faz um evento buscando dar visibilidade às RPPNs. A Sessão Solene alusiva ao DIA NACIONAL DAS RESERVAS PARTICULARES DO PATRIMÔNIO NATURAL (RPPNS) teve como objetivos celebrar a data e chamar a atenção dos cidadãos(ãs) florianenses para a importância das RPPNs para a preservação, em âmbito local, do patrimônio natural da municipalidade, bem como, destacar a relevância dessa modalidade de unidade de conservação (UC) na mitigação dos efeitos gerados pelas mudanças climáticas.

A Câmara Municipal de Marechal Floriano, nessa Sessão Solene, homenageou os proprietários das RPPNs Rio Fundo, Koehler e Reluz. Eu fiquei por conta de fazer uma fala sobre “A IMPORTÂNCIA DAS RPPNS NO ENFRENTAMENTO ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS”.


A cerimônia superou as nossas expectativas e abriu espaço para que várias pessoas se manifestassem, foi solicitada a criação de leis para a criação de RPPNs municipais e a inserção de um RPPNistas no Conselho de Meio Ambiente do município. A nossa RPPN Reluz assumiu esse compromisso de provocar o poder público e trazer à luz questões relevantes para que sejam discutidas e ações sejam estruturadas para resolvê-las. 

Celebrar o Dia Nacional das RPPNs com uma ação que promove a conscientização para a preservação da natureza, é reconhecer que a sociedade civil, juntamente com o poder público, unindo forças, pode criar uma rede de proteção para a biodiversidade, o que resultará em um município mais verde, sustentável e saudável. As RPPNs são unidades de conservação (UCs) estratégicas para a preservação do remanescente de Mata Atlântica, bioma que faz parte da vida do capixaba e precisa ser protegido. 

Esse cuidado não é apenas porque estamos em tempos de aquecimento global, ou porque dependamos dos recursos naturais para a nossa sobrevivência, mas também, porque a natureza nos humaniza e torna mais sensíveis para uma convivência pacífica e saudável. As RPPNs prestam serviços ambientais importantíssimos para todos, a cidade que possui RPPNs é mais bonita, oferece melhor qualidade de vida para seus moradores, as florestas mantém o equilíbrio climático, preservam as nascentes, mantém os polinizadores, abrigam seres da fauna e da flora, além de fomentarem a economia criativa e de baixo carbono, como o ecoturismo. Estudos indicam que cerca 80% do remanescente de Mata Atlântica está em terras de particulares. Sendo assim, a RPPN se apresenta como um instrumento importante para a conservação do remanescente de Mata Atlântica, contribuindo para o aumento das áreas protegidas, colaborando com a formação de corredores ecológicos e com o aumento da conectividade da paisagem.

Criar e gerenciar uma RPPN é ter a oportunidade de fazer algo por si e pela coletividade, é contribuir para com a preservação de uma variedade de espécies biológicas, entre elas muitas em perigo de extinção (ex. a uruçu capixaba), é proteger os recursos hídricos, contribuir para com a pesquisa científica e os estudos e monitoramento ambiental; entre outras. O/A RPPNista auxilia a expansão de territórios conservados e a perpetuidade dessa proteção é um legado de luz direcionado às próximas gerações.

A CRISE CLIMÁTICA

É o momento de a sociedade civil e o poder público unirem forças para enfrentar os efeitos da crise climática. Já é possível ver  os extremos dessa crise  se intensificando. O aquecimento global já não é mais uma teoria que possa ser questionada, É UMA REALIDADE, o relatório mais recente do IPCC apontou a ação humana como a responsável pelo aumento dos eventos climáticos extremos (chuvas torrenciais, inundações, incêndios, secas entre outras. A ciência aponta que a elevação de 1,5oC na temperatura média do planeta, aponta a criação de graves cenários de não retorno. O ano de 2024 foi o  mais quente já registrado na Terra e, pela primeira vez, a temperatura média global alcançou 1,6 C em relação ao tempo pré-industrial.

O fato é que SUPERAMOS AQUELE QUE É CONSIDERADO O LIMITE SEGURO PARA O PLANETA e as catástrofes já estão em curso o que exige ação imediata. Essa é a hora de unirmos forças na diminuição das emissões dos gases de efeito estufa e de TORNAR AS POPULAÇÕES MAIS RESILIENTES aos eventos provocados pelo aquecimento global. O planeta sempre existirá, mas a nossa sobrevivência depende de um novo olhar para o mundo e para o planeta do qual fazemos parte. Para um RPPNistas, a natureza é o maior patrimônio. As motivações que levam uma pessoa a criar uma RPPN são atravessadas por um senso de missão como afirmou o amigo Beto Mesquita: “É gente que sonha, mas que não se contenta só em sonhar. São seres humanos que, entendendo a beleza e o sagrado de compartilhar este Planeta com tantos e tão diversos seres de outras espécies, famílias e reinos, têm dedicado sua vida à proteção da natureza”.

A tarefa é difícil? Sim, frente a um cenário de insegurança e imprevisão, há pessoas que se sentem desanimadas como se não houvesse solução. Mas há solução, os mesmos cientistas do IPCC
destacaram que o marco zero da mudança é a restauração dos ecossistemas, especialmente das florestas tropicais. 1878 RPPNs brasileiras protegem 837,451,60 ha e no ES, 62 RPPNs protegem cerca de 6.500 há onde podemos perceber que é possível coabitar com a natureza sem destruí-la. A UFES realizou, em 2019, um curso de pós-graduação em mudanças climáticas. Nesse curso discutiu-se estratégias de neutralizar as emissões de gazes de efeito estufa (GEE), entre elas estão, além da recuperação de pastagens degradadas, modificação do manejo do solo, erradicação do desmatamento e controle de incêndios, a restauração da Mata Atlântica e o INCENTIVO À CRIAÇÃO DE RPPNS. Marechal Floriano possui três RPPNs constituídas. A primeira foi a RPPN Rio Fundo, criada Por Jaime Dozey e Maria Aparecida, no ano de 2012; a segunda foi a RPPN Koheler, criada em 2015 por Clovis Arnaldo Koheler e Silavana Brickwedde (in memorian), a terceira foi a RPPN Reluz, criada por mim e pelo Luiz. O município possui duas RPPNs em processo de criação. Os RPPNistas estão dando a sua contribuição para a grande virada ambiental que o mundo necessita e a esperança continua sendo o combustível verde que nos impulsiona rumo ao mundo que ansiamos.

PLANTANDO ÁRVORES
Na manhã do dia 01 de fevereiro, a festa teve continuidade e fizemos plantios de árvores na RPPN Reluz. Recebemos a visita do Vereador Cezinha Ronchi, responsável por realizar a Sessão solene no dia anterior, de Cícero Modolo, jornalista e agente cultural e de seus filhos Ester, Mateus e Rafinha. Cada criança plantou um pau-brasil que levou o seu nome e Cezinha plantou outro pau brasil em homenagem ao seu primeiro neto que recém nascido, o Ian. As crianças adoraram conhecer as abelhas melíponas e estamos certos que serão multiplicadoras do recado que a natureza lhes passou pedindo proteção.
Esse encontro fortaleceu os laços entre os RPPNistas e abriu espaço para novos e profícuos diálogos com o poder público.

Renata Bomfim

Externalizar é romper silêncios (Profa. Dra. Renata Bomfim)


Processo de externalização

Externalizar significa trazer para o exterior, mostrar, manifestar e possui o sentido de revelar algo se pensa ou sente, algum segredo, raiva, tristeza, entre outros. Um dos pais da terapia narrativa, Michel White, explicou o processo que o levou a definir a externalização com um dos pilares da nova teoria e destacou que sem essa importante etapa do tratamento, seria difícil diferenciar tudo aquilo que leva a pessoa a buscar a terapia do seu self. Trocando em miúdos, a pessoa chega ao consultório com uma narrativa satura de problemas, há um emaranhado, ou uma indiferenciação, entre o ser e o problema que impede uma análise do mesmo e a busca de caminhos alternativos que levarão a pessoa retomar a autonomia sobre o seu processo de melhora.

Externalizar é algo da condição humana, todos nós em algum momento, sentamos com um amigo, um parente, uma pessoa em quem confiamos e lhe contamos as nossas angústias, sonhos, desejos, mas, dentro do arcabouço da teoria narrativa, essa externalização segue um caminho específico que é acompanhado e direcionado pelo terapeuta para um outro espaço, um espaço aberto que difere daquele outro, fechado e opressivo que o problema oferece.

É nesse contexto que a terapia narrativa lança mão de aportes criativos. Um olhar raso para a arte no campo terapêutico pode indicar que é algo "menos sério" que outras abordagens aparentemente mais "científicas" ou "acadêmicas", mas não, é um modo de acessar o psique que vem sendo testada secular e cientificamente e mostrado resultados, vide os trabalhos da Dra. Nise da Silveira. As abordagens expressivas são poderosas para revelar, ou seja, externalizar conteúdos inconscientes.

O ego se acha senhor supremo da vida, ele caminha como um equilibrista sobre a corda fina e bamba, qualquer balanço pode fazer com que caia. É por isso que o acompanhamento/tratamento terapêutico é comparado a uma rede, cuja simples existência já é capaz de dar ao equilibrista a segurança necessária para andar nessa corda fina que é a vida e, caso venha cair, poderá voltar a subir na corda e seguir em frente. 

White destaca que é necessário externalizar o problema com vistas a criar uma definição interacionista e uma solução para o problema que antes, poderia ser visto como intratável, grave, desagradável. Essa abordagem do problema pode ser feita pelo caminho da ludicidade. As metáforas são ferramentas importantes nesse processo. 

"A pessoa não é o problema, o problema é o problema", eis um dos preceitos da terapia narrativa. Esse olhar, cunhado no âmbito de teorias contemporâneas como a desconstrução derridiano e uma série de abordagens relativamente recentes como o pensamento decolonial, respeita a singularidade de cada pessoa, não julga e nem possui caráter patologizante. A narrativa é a base desse trabalho que reconhece que os seres humanos são seres que interpretam ativamente as experiências da vida e essas interpretações não são neutras, mas permeadas pelo social, cultural, econômico, religioso, ecológico, entre outros. Será a trama resultante dessas experiências que será revisada, desfiada e tecida novamente de uma forma diferente, podendo acolher novos fios, novas cores, desenhos e texturas: o mesmo tecido, porém outro, renovado e criativo.  

Na minha práxis, como pesquisadora do campo da linguagem, acrescento a pensamento de Mikhail Bakhtin, especialmente os conceitos de dialogismo e carnavalização, para compreender e lidar com o fenômeno narrativo. bem como, conto com a contribuição de pensadores contemporâneos do Sul Global que ampliam o diálogo acadêmico com saberes oriundos de diferentes contextos, como no caso dos povos originários, buscando auxiliar o indivíduo à abertura e conhecimento de si e do outro. 

Para finalizar, externalizar é não calar, é romper silêncios. Poderia haver um começo mais significativo e marcado pela coragem do que esse para um processo terapêutico?

Renata Bomfim

23/01/2025

A Alma sofre, o coração sente, a arte transmuta: as dores de Gustav Mahler (Renata Bomfim)


Gustav Maher

Gustav Mahler foi um dos maiores compositor do período romântico. Ele era filho de pais judeus e viveu em uma província tcheco-austríaca. Aos seis anos, o seu talento musical foi notado e seus pais não pouparam esforços para que ele estudasse no conservatório de música. A família tinha uma condição financeira estável, seu pai possuía um negócio de bebidas, entretanto, mesmo provendo a família, era um homem bruto e de temperamento irascível e o que fez com que o menino crescesse em um lar muito conflituoso.

Desde a infância Gustav teve que conviver, juntamente com sua mãe, com a violência e os acessos de ira de seu pai. Essa vivência marcou a sua vida e o seu estado de ânimo passou flutuar, oscilando entre períodos de euforia e melancolia.

É certo que a arte nada tem de patológica, mas se observarmos a vida de Gustav Mahler e de pintores, cantores, compositores, escritores, entre outros, veremos que as vivências dolorosos impregnam suas expressões e se deixam entrever nos interstícios de suas criações. 

A obra e as declarações do artista revelam a sua luta contra crises maníaco-depressivas desencadeadas por essas e outras vivências dolorosas. 

A intensidade da obra do artista e trechos que, fora do convencional de sua época, foram descritos como sombrios, revelam a sua capacidade de transformar em sinfonia os sentimentos e afetos que fez ele ser a pessoa que foi. 

As dores e os sofrimentos não admiráveis, são eventos que não se escolhe, muitas vezes inevitáveis e aos quais a pessoa precisa responder de alguma maneira. Há quem fuja, quem enfrente, quem sucumba, mas é certo que ninguém sai incólume a essas vivências. É admirável que exista um Van Gogh, uma Frida Khalo, um Bispo do Rosário e tantos outros seres humanos que nos mostram o processo alquímico da dor transformada em arte. É admirável, também, a pessoa anônima que, dentro de suas possibilidades, luta para estar bem e para construir um ser e estar no mundo mais saudável e equilibrado. 

Volto a dizer que a arte não é patológica, mas ela tem a capacidade de fazer a dor se transformar em alguma outra coisa. 

No caso de Gustav Mahler, a profunda crise existencial as vezes lhe dava instabilidade e ele ao ser eleito, aos 28 anos, Titular da Ópera Real de Budapeste, não conseguiu continuar no cargo. A vida adulta do artista também não foi fácil, ele perdeu seus pais e suas irmão no período de um ano, alguns anos depois, seu irmão cometeria suicídio. Ele casou-se com uma mulher chamada Alma e teve suas filhas, uma delas morreu de febre escarlatina. O espectro da morte rondou toda a vida de Gustav e ele produziu obras como "Canções para meninos mortos" (Kindertotenlieder). Ele se viu ridicularizado nos jornais, vaiado e desprezado pelo público, mas encontrou conforto na vida doméstica, ao lado da amada esposa Alma.

Passado o período depressivo ele trabalhava freneticamente, se fechado em seu mundo particular de dor e solidão. Em um desses episódios, sua esposa insistiu que ele buscasse ajuda, foi quando o artista escreveu um telegrama para Sigmund Freud. O encontro entre o compositor e o psicanalista aconteceu em 1910 durante as férias de Freud na Holanda. Eles se reuniram umas três ou quatro vezes segundo os biógrafos, e esses encontros marcaram a vida de Gustav positivamente, tanto que ele agradecido a Alma, dedicou a ela a sua décima sinfonia: "Viver por ti, morrer por ti, Almschi!".

Gustav Mahler ia completar 51 anos quando faleceu de problemas cardíacos, em Viena. 

Renata Bomfim

Vitória, 23/01/2025


17/12/2024

Augusto Ruschi pelo olhar de Rubem Braga (Profa. Dra. Renata Bomfim)

 

“Sábio, anjo e criança”: Augusto Ruschi pelo olhar de Rubem Braga. 



 

Renata Bomfim[1]

A destruição das florestas é um dos fatores mais determinantes para o aquecimento global, fenômeno que ameaça grandemente a biodiversidade. Proteger o remanescente das florestas tem sido uma luta inglória, mas o Brasil possui muitos exemplos de coragem que não nos deixam desistir. Uma dessas pessoas inspiradoras é capixaba e, não por acaso, é o Patrono do Meio Ambiente do Brasil.

Augusto Ruschi (1915-1986) é natural de Santa Teresa e pioneiro na luta contra o desmatamento da Amazônia. No Espírito Santo, o ambientalista travou uma batalha contra políticos e corporações em defesa da Mata Atlântica. Pesquisador respeitado nos mais altos círculos da ciência mundial, Ruschi foi responsável pela criação de várias unidades de conservação no Espírito Santo e fundou, em 1949, o Museu de Biologia Professor Mello Leitão, que hoje é administrado pelo Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA), vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.

Augusto Ruschi não viu a questão ambiental desconectada da sociedade, ele conseguiu envolver pessoas de diferentes campos do saber na causa preservacionista, uma delas foi o escritor cachoeirense Rubem Braga (1913-1990), que era um apaixonado por pássaros e com quem desenvolveu uma amizade duradoura. As cartas trocadas entre o ambientalista e o escritor, denunciaram a sanha destruidora de grupos que tinham como alvo as florestas do ES. Para Rubem Braga, Ruschi era “sábio, anjo e criança em luta (desigual) contra o homem comum e suas vãs cobiças”. O escritor relatou que no romance Canaã, de Graça Aranha, há um personagem antepassado de Ruschi, mas para Braga, foi o ambientalista quem “escreveu uma das belas páginas do romance”, pois, “enquanto outros fabricam desertos”, Ruschi promoveu a reconciliação do homem com a natureza. Ele destacou ainda que “os bandos faiscantes de seus beija-flores coloridos formam como um grande arco-íris para anunciar essa promessa de paz”. Braga admirava Ruschi e utilizou, tanto a sua escrita, quanto a sua rede de relacionamentos fora do Espírito Santo, para ajudar nos assuntos do amigo.

No dia 25 de maio de 1976, Braga pediu a Ruschi informações que lhe possibilitasse embasar os seus escritos: “caso V. não tenha cópia do estudo que fez sobre a fauna e a flora, eu gostaria que me indicasse livros que me permitissem conhecer melhor o assunto, que me capacitasse a argumentar melhor em defesa das reservas”. Em resposta, no dia 01 de junho, Ruschi, enviou ao escritor suas pesquisas, que deram forma a um artigo publicado no jornal Diário de Notícias, que denunciava o que Braga chamou de “um projeto bárbaro”. O escritor fez ecoar as denúncias de Ruschi sobre os impactos de uma “macabra transação”, fruto de um conluio entre empresas e Governo Federal, que planejava derrubar “dezessete mil hectares de matas virgens, para extrair um milhão e trezentos e sessenta mil metros cúbicos de madeira”. Além da sanha de adquirir e explorar as reservas já criadas no ES, as companhias passaram a comprar terras de particulares, alijando “os descendentes de imigrantes” e espoliando comunidades tradicionais. O texto de Braga causou um grande incômodo, tanto que o diretor de uma dessas empresas procurou Ruschi e afirmou “o Rubem Braga fez muito mal e trocou alhos por bugalhos em seus artigos”.


Muitas informações contidas nas cartas, se transformaram em artigos e crônicas que davam visibilidade as belezas do ES, mas também desnudavam os impactos ocasionados pelas mãos dos que Braga chamou de “criadores de desertos”.


Na crônica intitulada “Elefantes e seus parentes”, Braga escreveu: “no Brasil dá pena e vergonha; acabamos por acabar praticamente com o próprio pau-brasil, vamos liquidando aos poucos, a ferro e fogo, tudo quanto é raça de planta ou bicho do mato”. Em alguns momentos Braga se tornou porta-voz do ambientalista: “Ruschi avisa que 200 espécies da nossa fauna e cerca de 300 da nossa flora já desapareceram para sempre. Milhares de outras estão em extinção. É reagir agora ou nunca”. Esse texto, singela homenagem a esses dois grandes capixabas, também faz ecoar esse grito de alerta: É REAGIR AGORA OU NUNCA!



[1] Escritora e ativista ambiental. Criadora da RPPN Reluz e fundadora do Instituto Ambiental Reluz. Acadêmica na cadeira nº 7 da AEL.