Seja bem-vindo(a). Este é um espaço pessoal onde, desde 2007, reúno poemas, ensaios e artigos de minha autoria, compartilhando também um pouco da minha trajetória como terapeuta junguiana e ativista ambiental. É um espaço aberto, para escritores(as) de várias partes do mundo.

26/08/2007

Arte - Espelho Multifacetado do Ser

para os meus amigos, mais um artigo antigo, escrito em 2000 e lá vai bolinha (2003)./ imagem: Orson Welles e Rita Hayworth na antológica cena da casa dos espelhos em The Lady of Shanghai (1947).

O homem não cria apenas porque gosta, e sim porque precisa, ele só pode crescer enquanto humano, coerentemente, ordenando, dando forma, criando.
(Fayga Ostrower)
Ansioso por aplacar sua angústia frente à complexidade do mundo, o homem moderno busca criar definições para tudo, e com a arte não acontece muito diferente. O que é Arte? Certa vez o pintor espanhol Pablo Picasso disse: “Todo mundo quer entender a pintura. Por que as pessoas não tentam entender o canto dos pássaros? Porque gostam de uma noite, uma flor, tudo o que cerca o homem, sem tentar entender essas coisas? Ao passo que quando se trata da pintura (...)”.
Eu acredito que a Arte não deve ser definida. Definir significa dar fim, esgotar. Assim, proponho que reflitamos sobre a arte; refletir significa espelhar, especular, flectir, inclinar-se para ver melhor.
Neste espelho multifacetado, que a arte configura, o homem pode se perceber, ver suas experiências refletidas. A arte não compete nem com a ciência nem com a razão, ela só pode ser explicada por ela mesma e na sua complexidade ela se realiza e se basta e o mais importante, ela se abre para o social.
Como artista plástica, dentre as possibilidades que a Arte oferece, optei pelo viés da Arteterapia. A Arte como instrumento terapêutico não é coisa nova, os gregos já utilizavam a música, a dança, o teatro, a pintura, a escultura, nos seus processos de cura. Estas expressões, inspiradas pelos deuses, possibilitavam ao homem a “Paidéia”, ou seja, originavam o homem 'obra de arte', criador e ético.
A Arte tem sido uma linguagem e um canal universal de expressão da emoção humana, desde os primórdios da cultura, ainda hoje se encontram refletidas nas cavernas, cenas do cotidiano, caçadas, símbolos, deuses e demônios do homem que ali esteve há cerca de 25.000 anos.
Criar para o homem é uma necessidade, dessa forma ele comunica o seu potencial subjetivo. Através da sensação de estar contido num espaço e de ter um espaço contido dentro de si, o homem pode melhor se estruturar; suas criações revelam suas experiências como indivíduo, diante de propostas e valores existentes dentro de sua sociedade.
Materiais plásticos como argila, madeira, tintas, pedras, entre outros, são veículos para que símbolos, muitas vezes vindos de camadas muito profundas do inconsciente se apresentem a consciência como imagens, estas imagens , muitas vezes, surgem carregadas de afeto, e trazem consigo a possibilidade de que os "não ditos" sejam expressos de forma menos ameaçadora e possam ser integrados, assimilados pela consciencia.
A Arteterapia não nega a estética, esta negação resultaria na morte significativa deste produto da criação, a arteterapia apenas mantém o seu foco, no fazer, no produzir.
Após a produção, símbolos individuais e coletivos poderão ser amplificados por quem os produziu. Símbolo vem do grego Symbalem, daí vem também a palavra balística, isso demonstra que o símbolo é algo vivo, dinâmico, certeiro, ele possibilita reunião de opostos e traz possibilidades de transformação pelo encontro do significado.
Assim acontece quando alguém cria, no diálogo com esta criação ela pode “especular” e “flectir” sobre si mesma, se auto-conhecendo e aceitando ou modificando, se re-criando com o objetivo de cunhar uma personalidade melhor adaptada, capaz de administrar melhor seus conflitos e questões.
Para que o indivíduo possa experimentar dos benefícios da arteterapia ele não precisa ter “habilidades artísticas especiais”, mas é preciso coragem na exploração do território sagrado da alma, povoado por aspectos do Ser muitas vezes negados ou negligenciados pela consciência.
Como contou o poeta Milton Nascimento “Nada a temer se não o correr da luta, nada a temer se não esquecer o medo, abrir o peito à força, numa procura, (...) vou descobrir o que me faz sentir, eu caçador de mim”.
É a jornada do herói, que deixa sua terra natal, o colinho quente e seguro da mamãe, e parte para a conquista. No caminho ele enfrenta maremotos, demônios e dragões, muitas vezes ele pensa em desistir, mas algo mais forte o impele a continuar, no fim ele resgatar a pedra de grande valor, que simboliza sua alma.
Nossa cultura vivencia uma neurose, para ser aceito o indivíduo muitas vezes nega aspectos do seu Ser, penso que a arte com cunho terapêutico, ou arteterapia, propõe uma integração, um indivíduo íntegro, ou seja, inteiro, e não perfeito, não se deixa limitar.
Finalizo novamente citando o Milton Nascimento:
Lapidar minha procura, toda trama lapidar o que o coração com toda inspiração achou de nomear gritando: alma(...) Viajar nessa procura toda de me lapidar, Neste momento agora de me recriar, de me gratificar. Te busco, alma.

Referências Bibliográficas:
- AMARANTE, P. Loucos pela vida. A trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. Rio de Janeiro: FioCruz, 1995.ARNHEIM, R. Arte e Percepção Visual. Uma psicologia da visão criadora. São Paulo: Pioneira, 1980.
- JUNG, C. G. O Homem e seus símbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1964._________. Psicogênese das doenças mentais. Petropólis: Vozes, 1986.
- MONTEIRO, Dulcinéia da Mata Ribeiro. Mulher Feminino Plural. Rio de Janeiro:Rosa dos Tempos,1998.



Publicado originalmente no site intermídias: http://www.intermidias.com/anterior/categorias/arte_renata.htm

7 comentários:

Luis Eustáquio Soares disse...

arquetípica renata, curiosa, instigante, vulnerável, forte, invencível, na fragilidade, a que se permite dizer, expressar-se, ser.
do amigo e admirador,
l

arquiteliteraturas disse...

Seu texto me lembrou os discursos de regime filosófico que debatem as relações entre corpo e mente, fazer e criar.
Há quem diga que não se escapa dos signos que nos precedem e nos cobrem após o nascimento. As roupas, os brinquedos e o nome nos revestem de camadas de tradições ancestrais, como armadilhas, para condicionar nossas respostas aos estímulos externos. O corpo se associaria à lápide em que se grafaria a cultura. A saga do homem se iniciaria muito antes da fase heróica.
Nesse caso, a mente não seria uma entidade dissociada da matéria, como, em linhas gerais, o quis Descartes. Tampouco seria razão pura, livre, “quae sera tamen”, da interferência de constituintes vitais e emocionais subjetivos, como o propugnou Kant.
Ela seria uma função do corpo, a fim de auxiliá-lo a equacionar o problema da sobrevivência?. Sei lá! Um e outro teórico da sobrevivência a perquirem como o valor derradeiro do homem, inclusive nas condições em que ele se imola. A consciência se edificaria a partir de um projeto, cujas condicionantes de partidos arquitetônicos se circunscreveriam ao emocional. Também não vejo tão táctil assim o criar e o fazer.

Mas, o corpo, Nietzsche o proclamou como nossa grande razão. Assim, isso a que denominamos razão seria uma pequena razão – um instrumento, um ludopédio da Grande Razão. Num ponto, descartes, Kant e Nietzsche parecem acordar: nada provém do nada; um e outro gênio até criam, mas os artistas (até etimologicamente) apenas fazem. Exemplo? Bach e seus intérpretes; Frank Lloyd Right e seus seguidores; Michelangelo e seus adeptos; o terapeuta da arte e seus pacientes.

arquiteliteraturas disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Renata Bomfim disse...

Carissimo (acho este termo chiquérrimo!)seus comentários são ricos que meu texto se inclina, humildemente!
A escola que, por ventade, escolhi para formação, tem suas crenças por esta via, na integridade corpo/mente,mesmo nos distúrbios marcadamente fundados na dissociação como a esquisofrenia.Um ser bio- psico- social- espiritual, claro que geralmente, uma destas pernas pode fraturada ou capenga, ou necrosada, ou amputada...
Certa vez recebi uma cliente no consultório, inteligentissima, bem sucedida na carreira, resumindo, muito resistente ao tratamento. A queixa desta pessoa era uma psoríase intermitente, que ia e vinha, e incomodava pra chuchu... de cara ela me disse: "não acredito nesse negócio de pscossomática, nem tudo é psicossomático". Ao final da sessão, ao preencher uma ficha com dados como endereço, contato, no item queixa, ela escreveu: "psicoríase".
o grande Pai da psicossomática foi Grodec, que inclusive contrinuiu bastante com a teoria freudina, ele é o pai do ID, e após ele outros levaram adiante os estudos neste campo, não posso me esquecer do "velhinho mais querido e fofo" o Jung.
Tudo é psicossomático, se não for psicossomático, é somatopsíquico!!! ehehehehe
abraços e
Uma boa semana

Renata Bomfim disse...

mestre Luis, psicopompo, deus da eloquencia, do bem- dizer,Mercúrio, a guiar- me pelos caminhos da academia.

abraços
re

Anônimo disse...

Oi Renata.. sou eu o Eviner... apesar de eu nao entender nada destas doideras.. hehe, mais achei seu blog muito legal e bonito... parabens pra você tambem, e breve meu site vai sair: www.brasilvirtua.com vai ser um portal com tudo até TV e Rádio ao vivo..

parabens.. e sucessos...
beijos de seu grande amigo Eviner.

John disse...

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