"Ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas: -Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria" (Brás Cubas)
Pos mortem I
Quando morta,
pensem que fui viajar
quem sabe para o mesmo lugar
de onde, um dia, vim.
Fazer o que, ainda não sei,
confeccionei bibelôs em gesso,
elaborei mosaicos dos infernos,
criei jóias, contei histórias, pintei,
bordei, toquei violão, fiz mandingas,
dança de salão, do ventre, e escrevi versos.
Fiz amor, fiz guerra e muita caridade
fiz o dobro de maldade
E rezei todos os dias, com a biblia
em uma mão e cristais, hervas e patuás na outra.
Graças, por essa humanidade que me assola
Experiência única e irrepetível.
Post Mortem II
Amigos, não sejam mesquinhos
quando eu me for
levem flores e chorem bastante,
se possível, contratem carpideiras,
vocês sabem como eu gosto de uma cena.
Mas por favor, não sofram
e nem fiquem tristes
saibam que terei vivido:
experimentado da dor, da violência,
da solidão, da amizade e de incontáveis alegrias
Saibam também que terei amado
não o suficiente, mas o bastante,
se isso é possível.
Amor de deixar o coração mole, pegajoso,
mas com o vigor do tambor de um menino.
Não fui mais porque não quiz
sempre me acompanhou o sinal de menos
em se tratando de viver, nunca pensei no
amanhã, sorvi o hoje gota por gota.
Então, digam de mim: "esta, soube morrer,
era um saco sem fundo, devorou a vida,
se lambusou toda, limpou o prato e, saciada,
foi dormir.
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