01/10/2015

O poema é livre (Renata Bomfim)

O poema é livre
como jamais serei.

Poema refugiado,
Poema mulher negra,
            mulher de sangue e carne
            mulher de cais
                        de alamedas
                        de gritos, xingamentos,
                        de claustros e de ais.
Apesar de tudo, o poema é livre, mas,
nunca serei livre de mim mesma.

A tentativa de criar incriados fracassou,
O homem estranha o calor de minhas entranhas,
não sabe que as vísceras estão em chamas,
desconhece a origem das brasas e das cinzas que
fazem sair fuligem pela boca:
                    poema estranho!
                    vida estranha!
                    morte estranha!
No intervalo do poema-vida-morte
                   a respiração ofegante,
                   o sentido do inacabado,
                   o caos costumeiro.

As letras possuem asas coloridas,
são borboletas e voam como se
a eternidade fosse a regra.
Invejo e gozo Hamlet e sua casca de noz:
palavras, palavras, palavras.
Caim ainda vaga pelas grandes avenidas
de São Paulo, Nicarágua, Lisboa, Madri,
encontrei-o uma vez em uma ruela de Cariacica.
Caim toma um trago todas as quintas, sem falta,
no boteco da esquina.

Perdi toda a filosofia,
Pendurei diplomas, basta!
Serei professora das minhocas e jacupembas,
Pesquisarei a música das cigarras e o coachar
das rãs atrevidas.
Caim que seja feliz como poder!
O poema é livre,
Isso me basta!



RB, Vitória, ES, 01-10-2015.


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