14/02/2023

"Divina Moqueca Capixaba" (Renata Bomfim)

Em 2011 tive a felicidade de saber que meus poemas sobre os alimentos, em especial as odes, estavam sendo utilizados nos saraus realizados pela Associação Internacional de Nutrição (World Nutrition). A publicação inicial foi feita por Fábio Gomes, a quem agradeço imensamente por ter sido o primeiro a acolher as minhas poesias nesse contexto de discussão, e posteriormente desenvolvido no artigo publicado na World Nutrition, February 2013, Volume 4, Number 2, por Geoffrey Cannon (Food, nutrition, health and well-being. What I believe, and other stories).

A minha hortinha poética continua crescendo e gerando alimentos para o espírito, mostrando o aspecto sagrado da terra e dos seus frutos , bem como, mostrando que a desnutrição e a fome são aspectos hediondos do egoísmo e da miséria humana. 

O alimento é coisa sagrada. Gaia, numa expressão de generosidade suprema, nos alimenta e sustenta. Alimento também é amor e, não por acaso, "comemos" e nos transformamos em verdadeiro baquete nos relacionamentos amorosos. A mercantilização da vida é uma corrupção do ser, de quem o ser humano realmente é em essência. 

O caso específico dos nossos irmãos indígenas Yanomamis, mostrou esse avesso do avesso do Brasil que, num surto coletivo, elevou aos mais altos postos de comando uma extrema direita fascista, corrosiva e corrupta. Chamo essa gente nociva de "dedos-podre", pois, tudo o que tocam definha e morre. 

A poesia, como expressão de insurgência da palavra-vida, foi vilipendiada e silenciada, agora ela tem despontado como uma bandeira importante, é preciso construir um país, CRIAR NOVAS NARRATIVAS, que nos reinventemos compromissados, criando o que ainda não existe: a justiça social. É preciso resgatar a dignidade e a alegria do povo brasileiro e, especialmente dos mais brasileiros dos brasileiros, dos donos e cuidadores da terra e das florestas, os povos indígenas.

Observei que o poema "Moqueca Capixaba", traduzido por Fábio Gomes para o inglês, foi publicado na China, levando um pouco da cor, da beleza do sabor da tradição da minha terra capixaba para o mundo.

Segue o poema nas versões português-inglês e o link para o artigo. 

Moqueca Capixaba 

She becomes hot so slowly, 

(Ela vai sendo aquecida, lenta e)

 gently, on a low flame,

(delicadamente, em fogo brando.) 

At the table, the loved one, 

(Sobre a mesa, o namorado,) 

warmed and amorous, awaits. 

(temperado com amor, espera.) 

Daughter of black native earth, 

(Pretinha de barro, filha de indio)

 In your lap, the fruit of the sea 

(seu colo acolhe o fruto do mar) 

is bubbling now, heavy with aroma. 

(fervilhante, emana seu odor.) 

And all of us wait, eager. 

(Esperam-na todos, deleitantes.) 

Now, a good table wine, 

(Um bom vinho, à mesa,) 

then a time of silence

(um silêncio respeitoso,)

 while mouths moisten 

(as bocas anseiam e marejam) 

like sails, experiencing the sea. 

(como velas errantes ao mar.)

Now it is the loved one that 

(E o namorado vai sendo devorado,) 

is devoured, transubstantiated. 

(transubstanciação) 

With Holy Spirit in our mouths, 

(Espírito Santo no céu da boca.) 

Moqueca capixaba is divine.

Divina moqueca capixaba! 




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