03/12/2015

Colóquio das árvores: a natureza em versos (estudo crítico de Andressa Zoi Nathanailidis)


Veio a lume pela editora Chiado, de Lisboa, o Colóquio das Árvores, livro da poeta capixaba Renata Bomfim. Essa obra poética reflete a tentativa estética de captar e, ao mesmo tempo, traduzir a intensidade e o mistério do mundo natural; repleto de forças múltiplas, muitas vezes postas em confronto face ao desrespeitoso exercício humano e capital, presente nos dias de hoje.

O Colóquio das árvores foi publicado, e está sendo distribuído nos países de língua portuguesa. A crítica lusófona Ana Luisa Vilela adverte o leitor para que “não espere dessa obra apenas a sisuda erudição hermética”, pois, há nela textos divertidos e picantes, que por vezes misturam a gulodice com a devoção, buscando harmonizar a raiz com o voo. “Poesia sem pose e íntima na sua dignidade, canto de abertura total do ser á utopia do vir a ser”, completa Vilela. A mirada crítica de Pedro Sevylla de Juana, por sua vez, observa que no Colóquio das árvores a poeta ressurge “metafórica e simbólica: pagã; fogo purificador e cinzas fertilizantes: terrivelmente humana”.

Os cerca de cem poemas epigrafados por Sylvia Plath, Rubén Darío, Hilda Hilst, dentre outros, tocam em questões delicadas, que resgatam a temática socioambiental, ao mesmo tempo em que abordam aspectos inerentes às grandes inquietações humanas-existenciais: o amor, a morte, a solidão e a esperança.

Renata Bomfim dedicou o seu Colóquio das árvores a Dora Vivacqua, a “extraordinária e deslumbrante Luz Del Fugo”, e a Freda Cavalcanti Jardim, “mãe do Mosaico brasileiro”. Natural de Vitória, a escritora trabalha poeticamente o “ser capixaba”, identidade híbrida e multicultural, com suas delícias e contradições. À memória da cronista e poeta Carmélia Maria de Souza ela dedicou o texto poético “Vitória é uma delícia”, que diz: “esta Ilha tem “um que” de Ítaca, Olimpo, Pasárgada.// Que glória e que sina a minha/ nascer e escolher viver numa Ilha/ de Camélias e Carmélia.../ Vitória é uma delícia”. Já o poema “Fantasmas da esperança”, dedicado ao ecologista Paulo Cesar Vinha, assassinado por defender a restinga capixaba contra a extração ilegal de areia, é um chamado ao engajamento. O poema interroga: “Até quando o ferro e o fogo calarão vozes mais esclarecidas?/ Por que no lugar das árvores/ estão sendo plantadas as sombras dessas existências perdidas?/ Morreram Paulo Cesar Vinha,/ Chico Mendes,/ Maria do Espírito Santo,/ Dorothy, irmã querida./ Morreu José Cláudio Ribeiro da Silva,/ defendendo as castanheiras e a nossa humanidade”.

O desejo, talvez utópico, de se ter um espaço pacífico - onde o convívio entre as existências se estabeleça em harmonia e plenitude - é o que constitui o ímpeto enunciativo de Colóquio das Árvores, retrato poético-universal, que externa essências e (des)valores, demonstrando ao público leitor a necessidade de um repensar a própria existência; o que se dá por meio de  versos repletos de mensagens, capazes de associar a apreciação estética à conscientização do exercício ético.

Renata Bomfim é conhecida pelo seu amor pelos animais, especialmente pelos felinos. O Colóquio das árvores se abre para essa paixão com textos como “Todo gato”, que diz: “Todo gato tem alma de santo,/ Todo gato é sacerdote, profeta,/ Arquiteto e malabarista.// Todo gato é zen e/ Oportunidade de amor ilimitado/ Para um ser humano”. O pesquisador Fábio Mário da Silva destacou que na obra em questão “a consciência ecológica desemboca em temas e subtemas como, por exemplo, a origem do cosmo, do ser humano, daquilo que é místico, primevo e erótico”, uma exemplar amostra de ecopoesia.


Dessa forma, quem puder ler esta obra, reconhecerá em Renata a “rosa” que se vê “incômoda” e “assustada”; o dizer do “bicho”; da “planta”; aquela que “grita” e pode “enxergar além”. Colóquio das árvores propicia ao leitor a oportunidade de reconstruir valores materiais e imateriais; de ver nascer diante de si algumas certezas: a de que é preciso tomar uma atitude face ao meio-ambiente; conscientizar-se das atrocidades históricas, envolvendo a exploração de povos negros e indígenas; zelar; pelo amor ao próximo; pela essência-vida, pelo conviver igualitário... Já que todos, em primeira instância, são matérias perecíveis, a percorrer um mesmo caminho, findouro, maior de todas as certezas. 

 Andressa Zoi Nathanailidis  
Jornalista e Dra. Em Letras pela UFES.

02/12/2015

La Tupiniquim que me habita (Renata Bomfim)

En recuerdo de los indios que poblaron la isla de Vitória (ES) antes de la colonización portuguesa y durante ella: y para aquellos que, aún hoy, resisten la opresión y luchan por la ciudadanía. 

En mi interior duerme una noche arcaica
Cuyas tinieblas casi pueden palparse.
Crece también una espesura densa,
Donde los árboles organizan coloquios.
De esa oscuridad oigo ecos de voces, susurros.
Mi cuerpo se estremece con el batir de un tambor,
No puedo ignorar ese ritmo que hace de mí quién soy.

La sangre espiritual de un pueblo porta
El registro de la historia de su resistencia.
Vi chocar  dos mundos. Sentí el embate de creencias y tradiciones.
Vi  mi tierra bañada en sangre.
Descubrí el cortejo de ladrones llevándose muy lejos,
Con el oro y  la madera, la fe, la esperanza y la alegría…
 Todos esos registros permanecen dentro de mí.

Habita mi profundidad marina una india Tupiniquim
de cabellos ondulados y ambarina mirada.  
Posee habilidades para preparar ungüentos,
Cura pesadumbres seculares, resentimientos,
En la noche, devuelve el arrojo al guerrero.
Cuando curo un pájaro que cayó del nido,
O protejo a un animal como si fuera mi hijo,
 No soy yo, es ella, la india de cántico dulce…

Cualquier capixaba refugia un indio en su interior,
 Que le impulsa a oponerse a la esclavitud.
Ese ente posibilita que seamos singulares, especiales…
Necesitamos aceptar esa marca de Caín
(salvoconducto de los libres…)
Ser capixaba es ser heredero de ese pueblo luchador
Es ser presencia, es ser presente, es ser lo venidero…


(tradução para o castelhano por Pedro Sevylla de Juana)


25/11/2015

Lançamento de obras literárias no II Festival de Literatura Sesc Glória/ 2015


1/12
 Horário: 20:00h.
Escritores: Jhon Almeida, Anthony W. Marques e Vander Vieira
Obras: Meus versos, um tudo do meu eu, Silêncio e Descaminho.
Local: Sala da Palavra

2/12
Horário: 20:00h.
Escritores: Aline Dias, Isabella Mariano e Israel Rozário
Obras: Além das pernas, Cortes Lentos e Com dias cantados.
Local: Sala da Palavra

3/12
Horário: 20:00h.
Escritores: Renata Bomfim, Caco Appel e Izabela Orlandi
Obras: Colóquio das árvores, Leituras – Crônicas do prazer de ler e Vão dos bichos.
Local: Sala da Palavra

04/12
Horário: 20:00h.
Escritores: Caê Guimarães, Pedro J. Nunes e Weber José Vargas Müller
Obras: Vácuo, A última noite e Similitudes poéticas.
Local: Sala da Palavra

05/12
Horário: 15:00h.
Escritores: Juane Vaillant, Déborah Andrade e Hideki Hagiwara katsumoto
Obras: O mundo de cá, Mistério inacabado e Momotaro, o menino pêssego.
Local: Sala da Palavra

06/12
Horário: 19:00h.
Escritores: Wagner Silva Gomes, Ingrid Carrafa e Carlos Fonseca
Obras: Classe média baixa, Entre rosas e abismos e Mil e tantas palavras.
Local: Sala da Palavra

Fluidez e versatilidade na série “Nova Riqueza”, de Sandra Resende (por Renata Bomfim)




Nas primeiras décadas do século XX a arte passou a apresentar como marca uma indeterminação sem precedentes na história: nada mais seria como antes! A liberdade radical a qual os artistas modernos foram expostos resultou em estranhamento e angústia. Segundo Ronaldo Brito[1] essa “crise na Arte”, para além de refletir um mundo submerso em processos de transformação e desfiguração, mostrou que a arte é um “isso problemático e reflexivo” em constante interrogação.  A vanguarda modernista criou inúmeros novos esquemas e procedimentos artísticos que, ironicamente, abriram caminhos reflexivos para artistas, críticos e publico, e de repente, o antes era “inaceitável”, passou a ser incorporado pela à tradição.

 Os artistas contemporâneos são herdeiros dessa geração que fez da experimentação e da exploração o seu lema.  É como se o “Anjo da história”, pintado por Paul Klee, tocasse a trombeta e nos convocasse a juntar os destroços do tempo. Walter Benjamim, argutamente, percebeu que um amontoado de ruínas crescia em direção ao céu, e que uma tempestade chamada “progresso” se aproximava.
Olhamos para trás saudosos e melancólicos, e para o futuro sem saber que caminho tomar; resta-nos os destroços e, frente aos fragmentos de nossa própria identidade, o que fazer?  Na obra Tudo o que é sólido desmancha no ar, Marchall Berman[2] alertou que o único jeito de o individuo sobreviver na sociedade, seria assumindo uma personalidade fluida. A identidade desse sujeito maleável, posto entre os estados líquido e gasoso, não é fixa, mas muda constantemente. As existências fluidas e as mudanças ininterruptas marcam a vida desse ente, e a arte o companha na sua errância. O caráter liquefeito da sociedade contemporânea não permite que nos voltemos para os mestres do passado em busca de respostas que nos garantam segurança. Os arroubos revolucionários e ideológicos migraram para os objetos descartáveis, são revolucionários os cremes anti-idade, o detergente líquido, a ação do desinfetante, o aparelho eletrônico que promete facilidades inimagináveis e felicidade. 
Sandra Resende é uma artista contemporânea que não se fixa e nem se permite enrijecer. Nesse sentido a sua produção se alinha com a de artistas como Beatriz Milhazes, Vik Muniz e Adriana Varejão. Destaquei, em outro ensaio, que a obra de Sandra Resende transita entre o acadêmico/ figurativo e o abstrato, bem como, na representatividade da expressão sacra no seu percurso como artista. Dentro do universo multifacetado dessa poética as cores desempenham um papel essencial, elemento que encontra complementariedade no desenho e na gestualidade.
A série “Nova riqueza”, de certa forma, é uma antinomia, uma tentativa de reconciliar o que aparentemente é irreconciliável. Ele busca inspiração nos escombros do garimpo de Serra pelada, trazendo à luz importantes reflexões sobre os modos de ser e estar no mundo do homem contemporâneo. É possível revertermos a grave crise ambiental na qual estamos submersos, por sua vez, não é a crise ecológica, a face de um caleidoscópio que envolve outras dimensões humanas, não menos importantes?
Sandra Resende possui uma obra versátil, pois a sua plasticidade lhe garante a possibilidade de ocupar variados lugares no desejo do espectador. A fluidez dessa poética é radical, nela a mancha de tinta é trabalhada tendo como inspiração o mineral, a pedra bruta e os metais extraídos da terra, elemento imanente por excelência. A série é formada por dez telas, de média e grande proporção, pintadas sobre linho ou canvas que sustentadas por chassis de mogno, ou pinus, tratados com pigmentos naturais e óxidos sintéticos.
O despertamento para esse trabalho veio da observação da mutabilidade da natureza. O garimpo de Serra pelada, situado no Pará, já foi considerado o maior a céu aberto do planeta. A cratera de onde os homens extraiam ouro a poucos metros atraiu pessoas de todo o Brasil na década de 1980. Os sonhos de riqueza dos homens simples, logo, cederam lugar à realidade: uma vida insalubre e marcada pela guerra de forças e tensões entre poderes. Serra pelada é uma alegoria do estado da arte na série “Nova riqueza”, nela dialogam o sensível e o bruto/violento, marcados por movimentos de descoberta, por sonhos, explosões, degradação, ruína e reconstrução.
Nas telas encontramos a força do amarelo e de uma profusão de ocres e marrons que convidam à garimpagem. É preciso ir mais fundo, cavoucar novos sentidos, dialogar com as camadas da terra, penetrar nos mistérios o elemento feminino, Gaia , fonte alimentadora da vida. Há muito o que observar na série de pinturas: a violência de algumas pinceladas cinza vão, gradativamente, se diluindo e, de repente, revela-se um veio d’água.

A arte contemporânea abre caminho entre os escombros do passado e, a despeito da incerteza constante, do consumo desenfreado e da corrosão dos valores tradicionais, há a renovação e a gestação do novo. Embora Sandra Resende seja uma artista nascida século passado, e tenha experimentado a si mesma nos diferentes sistemas acadêmicos propostos pela arte, ela se abre para o novo e convida o expectador para que aventure nesse universo de reconstrução paisagística, plantando nas áreas degradadas e criando devires.

Renata Bomfim



[2] MARSHALL, Berman. Tudo que é sólido desmancha no ar. São Paulo: Ed. Schwarcz, 1986. P. 93. 

24/11/2015

II Festival de Literatura Sesc Glória/ES. Lançamento do livro de poemas "Colóquio das árvores", da escritora capixaba Renata Bomfim



O Colóquio das árvores será lançado
Dia: 03 de dezembro de 2015, 
às 19 horas no Sesc Glória/ES.

O II Festival Capixaba de Literatura do Centro Cultural Sesc Glória tem por objetivo a aproximação entre o leitor e o autor capixaba, ou que produz no Espírito Santo. 

Entre os dias 03 a 06 de dezembro, serão lançados 18 títulos, sendo três autores por dia e um debate-papo entre eles, também estão programadas apresentações artísticas que irão corroborar para compor o Festival.

10/11/2015

Com poesias, Renata Bomfim faz um chamado urgente à preservação do Meio Ambiente (Jornal ES/Hoje)


Com poesias, Renata Bomfim faz um chamado urgente à preservação do Meio Ambiente

                               Renata Bomfim






Em um momento crucial da nossa história em que mudanças climáticas causadas pelo desrespeito do homem pelos recursos naturais geram mandas sociais graves, como a crise hídrica que assola do Espírito Santo, a poetisa capixaba Renata Bomfim lança na próxima quarta-feira (11), a partir das 19 horas, na área aberta do Shopping Jardins, o livro de poemas Colóquio das Árvores.
Dividido em cinco seções intituladas de O Grito da Rosa, Colóquio das Árvores, O Cisne e a Flor, Cantos de Vida e de Esperança e Hortinha Poética, a obra aborda temáticas socioambiental, ao mesmo tempo em que abordam aspectos inerentes às grandes inquietações humanas-existenciais: o amor, a morte, a solidão e a esperança.São duzentas e duas páginas contendo cento e vinte poemas que dialogam diretamente com grandes autores, como Sylvia Plath, Rubén Darío, Hilda Hilst, Florbela Espanca e Camões. O desejo  utópico de se ter um espaço pacífico entre o ser e o ter define Colóquio das Árvores, inserindo o leitor na epígrafe de Renata e suas referências literárias, juntamente com a necessidade de repensar a nossa existência por meio de versos.
A leitura da obra propicia a oportunidade de se reconstruir valores materiais e imateriais. A mensagem é de urgência em relação à temas ambientais e humanitários. “Temos que nos conscientizar acerca das atrocidades históricas, envolvendo a exploração de povos negros e indígenas, por exemplo. Minha obra é um convite ao zelo pelo amor ao próximo e o conviver igualitário”, conclama a autora. A apresentação das poesias do livro será feita no dia do evento pelo poeta e crítico espanhol Pedro Sevylla de Juana. Além do lançamento de Colóquio das Árvores, a área aberta do Shopping Jardins será palco para um sarau musical e poético com as integrantes da Academia Feminina Espírito Santense de Letras. 
A autora: Renata Bomfim é natural de Vitória/ES. É bacharel em Artes Plásticas, mestre e doutora em Letras pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Pesquisadora do CNPq é membro do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo (IHGES) e ocupa a cadeira nº 16 na Academia Feminina Espírito-Santense de Letras (AFESL