02/04/2023

A poeta Renata Bomfim (Profa. Dra. Ester Abreu Vieira de Oliveira)

 Renata Bomfim é autora de livros e artigos, nasceu na ilha de Vitória, capital do Espírito Santo (Brasil), no dia 21 de novembro de 1972. Pertence à Academia Feminina Espírito-santense de Letras e foi presidente na gestão de 2016-2018. Graduou-se em Artes Plásticas, Mestra e Doutora em Letras, pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Especializou-se em Psicologia Analítica Junguiana; Arterapia na Saúde e na Educação e em Psicossomática. Desde 2007 integra o grupo de pesquisa do CNPq intitulado “Aproximações Regionais: Alentejo Português e Nordeste Brasileiro” – Florbela: romanceiros e romance sergipanos pela Universidade de Sergipe. Gestora cultural e educadora socioambiental com foco na sustentabilidade. Suas obras poéticas: Mina (Vitória, Helvética […] Editora, 2010), Arcano Dezenove (Vitória, Helvética […] Editora, 2015), Colóquio das Árvores (Chiado Editora, 2016) Coração de Medusa (Editora do Autor, 2021), iniciam e terminam, com prefácios e posfácios, verdadeiras críticas literárias, nas quais o leitor não pode deixar de ler para mergulhar no “coração” do “eu lírico” que assim explica em Coração de Medusa (p.95): “O coração que pulsa,/ O corpo que vibra, a despeito/ Da dor, da dor, dor… e do medo!/ Meus poemas são, todos eles.”. Logo, sua “verdade”, está em sua poesia, em seus versos, na comunicação que estes estabelecem. 

 

Em todas as quatro obras o “eu lírico” valoriza a arte de escrever. Exemplo é o poema “Exílio” (p. 171), dedicado ao escritor Francisco Aurélio Ribeiro, em Colóquio das árvores, quando o “eu lírico” declara o seu desejo de escrever: “No Oceano povoado,/ Por letras, acentos e velas,/ Busco a folha em branco./ Terra firme onde a palavra,/ Insurrecta, prospera.”

 

Em Arcano dezenove, no poema 1- “Despertar” (v. 25-29, p. 21) e no poema 2- “Poemas” (v 1- 7, p. 22) a autora emprega a palavra “ritmo”

 

1 – Desperta tudo que dormita:

     Emoção, mímica, interjeição…

     Transita no ritmo

     Explode e goza num grito

    Poesia!

 

2 – As letras que, amorosamente,

      coloco sobre o papel

      não fazem o poema e o 

       ritmo embalado

       que se alterna em toques 

      não lhe confere musicalidade.

     A minha pena guarda segredos [….]

 

O “eu lírico” reconhece que o ritmo é um trânsito para a expressão poética. Ele só não basta para o texto integrar-se com a linguagem poética. É necessário haver uma articulação sintática e semântica na configuração rítmica e melódica para o poeta chegar à metáfora do sentimento, sem preocupar-se com a precisão conceituosa como faria um filósofo. Porque o poeta busca a imagem adequada para expressar o sentimento que imperará em seu texto. A metáfora é a sua arma expressiva: “Explode e goza num grito/ Poesia!” (ex. acima 1). E a poesia que “explode” é a bela interpretação que surge para apresentar o estado espiritual do “eu lírico”, expressado numa expressão autêntica de uma iluminação da existência humana no universo, guardada no silêncio da alma: “A minha pena guarda segredos.”  (ex. acima 2).

 

Agustín Basave Fernández del Valle (2002, p. 28) conceitua a poesia como linguagem rítmica, que emociona e agrada com significado existencial pleno: “La poesía es lenguaje rítmico, selecto y cautivante de lo emotivo, vertido bella y metafóricamente, em plenitud significativo existencial”.

 

De uma maneira geral, muito se tem procurado em prosa e verso conceber a poesia e se pretende que é alguma coisa que ao ouvido agrada, dá prazer estético, respeita os limites do espectador, exige distância e convida o olhar para uma comunhão acalentadora. Chega-se sempre à conclusão de que é uma bela interpretação da vida do homem, quer seja espiritual ou moral. Logo, sua essência é a manifestação semiótica que mana e dá prazer bom ou mal ao leitor.

 

Octavio Paz (1982, p.50) esclarece que “O poema nos revela o que somos e nos convida a ser o que somos.” 

 

O leitor encontrará nesse quarteto de obras de Renata Bomfim uma interferência de valores e de experiência de vida. Um descobrir do mundo ao redor, como quando o “eu lírico”, no poema “Irmandade”, em Mina (p. 17), confessa seu desejo de integração:

 

[…]

Há forças que não podemos explicar.

Elas fazem com que nos juntemos

e queiramos estar

no desejo do outro

e desejemos ser o outro,

bebendo da fonte e brotando da terra.

Um outro tão espe(ta)cular

e próximo que bem

poderia ser nós mesmos.

 

Em Mina, Renata reúne 89 poemas, colocados em três sessões poéticas (“Na Lavra”; “Arrebentação/ Explosão”; “Deslumbramento” e “Lapidação”), que vêm acompanhadas de epígrafes com textos de: Walt Whitman, Hilda Hilst, Charles Baudelaire e Freda Cavalcante Jardim, respectivamente. Nessas seções há teceduras de desejos, solidão poética, paixão e abandono. Há erotismo, a despeito de tabus, na procura de eternizar um momento, em “Encontro” (p. 82): “[…] Mas o divino acontece/ e nossos eus se tocam/ Eis o que acredito ser/ o milagre da vida” 

 

A autora relaciona mitos, por exemplo, o de Penélope e Pandora, em “Tecendo a espera” (p. 103), numa busca de sonhos que crescem e se desfazem (“lei do ofício de tecer”), mas há uma esperança afinal, “mudanças acontecem”. Lamenta a morte de um animal de estimação “Minha Lili” (p.135) e uma amiga “Canção para Frida Kahio (p. 133), e cita e parafraseia Fernando Pessoa em “Mentiras sinceras” (p. 85-96): “Eu finjo e minto sim!/ Finjo ter o que não tenho e/ ser a pessoa que não sou”, e ou mencionando os “fingidores”, os poetas: Pessoa, Nobre, Hilda, os irmãos Campos, com a assistência de Pignatari. Além desses poetas, faz referências a outros: Juan Ramón Jiménez, Drummond, Cabral e Adélia Prado, comprovação de que é uma leitora sensível e intelectual. 

 

 Em Arcano Dezenove, com perto de noventa poemas, oito epígrafes como uma forma de dizer mais, que abordam o social, o político, o literário, o meio ambiente, o religioso, o folclórico, o feminino e o erótico, a poeta torna a mostrar uma pessoa sensível, culta e cultivadora de uma sincera amizade, e dedica-o a “todas as pessoas que acreditam”. Com o poema “Cicatriz” (p. 37) a autora retrata o estigma do feminino, desde a origem do mundo, destinada a mulher ao cotidiano trabalhar e a ser desrespeitada.

 

Nos subtítulos, isto é, nas “partituras” (“Memória”, ‘Quintessência”, “Transição”, e “Rituais”)  os tempos se encontram.

 

Toda a obra envolve o leitor numa atmosfera de paz. O título tem como base a numerologia e o tarô. Na obra há um direcionamento para uma “desnudes“ do conhecimento de um mundo transformado, recriado e purificado pelos símbolos. Nas marcas da emoção e nas imagens, a poesia surge: “Desperta e ama o sabor filosofia!/ Desperta tudo o que dormita:/ Emoção, mímica. interjeição…/ Transita no ritmo. Explode e goza num grito:/ Poesia!”. (“Despertar” v. 23-28, p. 21)

 

No “Poema adâmico”, abertura de Arcano Dezenove, surge o tema da criação poética, numa analogia com o Mito do Paraíso. Assim, Adão, o mito bíblico que nomeou os seres, serve à autora para fazer uma analogia com o fazer do poeta e sua criação mediante a palavra: “No paraíso da linguagem/ O poeta com desvelo/ Inclina-se para amar a letra” (v 1-3). Com esse subterfúgio o “eu lírico” parafraseou poeticamente a história do livro do Gênese para ilustrar a sabedoria, o conhecimento da significação que o leitor poderá encontra em Arcano 19, no “Poeta Adâmico”:

 

No paraíso da linguagem,

O poeta, com desvelo, 

Inclina-se para amar a letra. 

Nesse momento, ele é Adão,

Ansiando companhia, à espera

De que a fêmea se submeta.

Cometidos os pecados,

Do outro lado, a pena:

“Ganharás o pão com trabalho, 

Com o suor de tuas mãos,

E também, com teus pulmões, 

Rins, fígado e coração.”

O homem se pega em desatino,

A sua vida será labor e sacrifício, 

Mas estava escrito:

Havia de ser assim

Para que pudesse seguir nomeando 

As coisas e povoando a terra

Com Abeis e Cains. (p. 17)

 

A autora, em “Poesia vegetal” (p. 81), com a metáfora do renascer da primavera, apresenta o sentimento poético do recôndito da alma que “desperta trazendo consigo/ coisas antigas que durante séculos/ foram silenciadas”. Com apoio de folclóricas receitas ela se vale de vegetais miraculosos, salvadores da fortuna, do espírito e dos males corporais, que atendam a orações, e recorda pedidos arcaicos; relembra a ajuda de plantinhas em benéficos banhos, que, auxiliados pelos eflúvios da erva medicinal e os delicados raios lunares, reorganizam a vida do outro, em “Banhos de limpeza” (p. 77): “Os caminhos se abrirão/ o olho gordo cairá por terra/ tua sorte voltará/ tudo isso com um banho,/ ou melhor, sete banhos”. O poema “Filtros mágicos” (p. 76) serve ao “eu lírico” de subterfúgios poéticos da técnica de conselhos, semelhante os de benzedeiras, para estimular a preservação do ambiente. 

 

[…]

Pegue uma ervinha brejeira,

catuaba ou coentro.

Besunte no mel e depois

enrole em seu lenço de algodão

Diga: “Ervinha poderosa e amiga,

faça “fulano “(diga o nome da pessoa)

se entregar aos meus caprichos”

Repita a frase três vezes

enterre o lencinho na praia

e espere …

 

Renata, em Arcano Dezenove, esmiúça a carta do tarô com uma força mágica interior em uma significativa extensão e, no poema “Arcano dezenove” (p.35), se despe. Eroticamente, o “eu lírico” vai se transformar em “cálice” (v.12) receptor do amor, do cosmo: “Te sinto mistério maior/ Quasares, buracos negros, estrelas/ tudo, tudo, tudo me leva a ti” (v. 24-26) e, diante da beleza e mistério da natureza, com sinceridade poética, se entrega, e se reveste de “lírios” e “lilases” (v. 21-22). Nesse momento vai nascer, ou renascer, em toda a sua intensidade. 

 

Como nas outras obras de Renata, também, em Arcano Dezenove perpassa sua integração com a natureza que se realiza com profunda intensidade. Viver o impulso vegetal é sentir no universo a força que desprende do vegetal e sentir-se sereno. No poema “Nossa Senhora dos raios multicoloridos” (p. 27, v 17-18), o “eu lírico”, humildemente, declara sua interligação poética: “Meu canto, aprendiz, foi marcado/ pelo ritmo da natureza”. No poema “Terra’’ (p. 72), indica a totalidade de seu amor pelo meio ambiente: “Amo a Terra/ Das entranhas ao infinito/ e os seus arabescos/ Conflitantes/ Divinamente pintados”, e em “Semear”, apresenta a sua preocupação ecológica e oferece conselhos: “Não despreze a natureza,/ Não pise na grama,/ nem arranque a flor. […] Semeie, plante, cultive:/ amizades, flores, árvores, idéias de luz./ Plante e acredite/ Sem fé, amigo, nada germina”. (p. 72, v 1-11).   

 

Em “Pos Mortem II” (p. 39, v. 11-14), com o tema da frustração, o “eu lírico” se desnuda num auto-retrato, (como num confessionário): “E amei, amei… não o suficiente, mas/ o bastante, se é que isso é possível./ Não fui mais porque não quis/ nunca pensei no amanhã”. 

 

Despojada da linguagem a autora vai dando consistência ao império dionisíaco e, com força mágica, vai dominando a atenção do leitor e, com ritmo que infunde vida, num jeito especial de escrever, vai brincando com os signos e ensinando-nos o amor à vida e deflagrando sua vida interior, que é o erotismo, segundo George Bataille, “[…] o desequilíbrio em que o próprio ser se põe conscientemente em questão”. (1987, p.29). 

 

Em Colóquio das Árvores, entre escritores, mitos, cidades e patriotismos, transbordam preocupação pelo meio ambiente e amor à natureza, como o título e capa já revelam na cor e na imagem e a doação do produto das vendas da obra, revertido para a reserva Reluz, dentro da Mata Atlântica, projeto de proteção ambiental de Renata e seu esposo Luiz.  Mas há, ainda, claramente o objetivo de estímulo à leitura, e de amor aos livros e às artes, pois além da citação a escritores, a dedicatória é um estímulo à leitura, e a constância de apresentação de epígrafes. A primeira, na introdução da obra, antes da dedicatória ao leitor, traz versos de Rubén Darío, escritor nicaragüense, com o tema da sacralidade da terra, e a segunda epigrafe, surge antes de uma citação bíblica de Lucas 19:40,  “Se estes se calarem, as pedras clamarão”,  com, o poema  “O grito da Rosa”, com o tema da necessidade de protesto, com o tema do desejo de liberdade, com palavras de Syvia Plath, escritora norte-americana, e, na página seguinte, ainda na introdução da obra, se encontra uma dedicatória a sua amiga, ex professora sua e artista plástica, Freda Cavalcanti Jardim, e a Luz Del Fuego, a capixaba e artista brasileira, pseudônimo de Dora Vivacqua. À continuação seguem poemas quase coloquiais e, entre a literatura e o folclore e os mitos, exemplo é o poema “Enciclopédia das plantas” (p.209, louvando as vantagens do alecrim, da alface, da arruda., da trepadeira, do bambu e, por  último da beladona:

 

[…]

A beladona é uma moira que corta o tempo

Sem piedade com a sua tesoura, mas

Antes brinda o ser com sonhos lascivos e

delirantes.

Era a planta rainha dos Sabás das feiticeiras. 

 

Coração de Medusa, obra bilíngue, português/espanhol, traduzida pelo poeta espanhol Pedro Sevylla de Juana, creio que a mais resenhada de suas obras, surge num período da pandemia da covid 19. O poema “O coração da Medusa” (p. 21), que dá nome à obra, trata da entrega amorosa e da consumação do ato da entrega “A volúpia eternizada/ numa estátua de carrara”. Esse mito se repetirá em outros poemas. Em “O silêncio da Medusa” (p. 47 “Incompreendida, só,/ mal vista e mal dita, / Medusa guarda silêncio,/ já não necessita das palavras/ A pedra é consolo e guarita.” O erotismo exala no terceiro poema desta obra, com 17 versos, na maioria, heptassilábicos. Esse poema dá nome à obra, “O coração da Medusa”, p. 21, mas não a representará em sua temática, pois esta é muito variada. O poema relembra uma obra de arte da mítica figura de Medusa: “A volúpia eternizada/ numa estátua de carrara”. (v. 16-17). 

 

Nessa obra se intensificam poemas eróticos e o aproveitamento dos mitos, já ilustrados nas obras anteriores, e se adentra na temática do feminismo, na valorização da mulher, na transformação da mulher e da importância da escritora que mergulha os dedos “no abismo do tinteiro” (p. 23),  constrói “castelos com palavras” (p. 42), e  impulsa a outras mulheres a escrever, a modificar-se: “A sua pena traçou a minha sina” “[…] se minha avó me visse agora, /Quanto orgulho teria da sua linhagem,” (p. 23). Também surge na obra aumento da indicação de mitos femininos: Circe, Penélope, Medeia, Salomé, Cleópatra, Medusa, Eva, Lilith e se acrescentam mitos literários: Florbela, Beatriz, Renata, ficcionada,  mitificada: “[…] Florbela e Renata./ A nova Eva, desbocada e louca,/ traz no céu da boca o mel, o fel” (p. 18). 

 

A obra se divide em quatro partes, todas com epígrafes: 1- “Canto iniciático”, a epígrafe são versos de “Piedra del Sol” de Octavio Paz, seguidos de dez poemas; 2- “Queda”, a epígrafe é formada de  versos de “Prelúdios-intensos para os desmemoriados do amor” de Hilda Hilst, seguidos de dez poemas; 3- “Ascensão” com a epígrafe de versos de “Canto Cômico” de Hernesto Cardenal, seguidos de onze poemas; 4 “Outros poemas” não consta epígrafe, mas uma nota da autora explicando como  e o porquê foram gerados e fazem parte do livro. Era como se a autora tivesse necessidade de um dizer mais de um desejo de “[…] ressoar a voz serpentina da Góngora” [… e que ] Foi entretecido nas sombras de mim mesma, fio a fio… cada ponto uma busca, cada busca uma surpresa, um vazio, uma saudade, uma esperança: medusa é a sombra de Penélope” (p. 98). Os sete poemas desse acréscimo são construídos por subdivisões.

 

O poema “Litania à serpente ou a nova gênese” (p. 17-18) dedicado às “mulheres desse novo mundo”, com 17 versos, apresenta um valor emotivo, sensorial em estado abstrato. Os olhos maravilhados, espantados, do “eu lírico” assiste a um encontro  sigiloso do mundo e deseja renová-lo, e aumentar o amor, livrar-se “da luz que cega e separa” ( v.24):

 

O mundo,

Nave? Claustro? Túmulo?

Espaço vazio e nulo,

esteriliza pelo horror, o absurdo.

[…]

Preciso repovoar o mundo,

dar novos nomes a tudo e,

para Eros, missão precisa:

flechar a si mesmo!

 

Em fim, nas obras poéticas de Renata Bomfim, Mina, Arcano Dezenove e O coração de Medusa, ela busca envolver o leitor apontando seus sentimentos sociais, morais e culturais. Ali se encontram as admirações e inquietações do “eu lírico”, nas recriações da vida.

 

REFERÊNCIAS

 

BATAILLE, George. O erotismo. Tradução de Antônio Carlos Viana. Porto Alegre: L&PM, 1987.

FERNANDO DEL VALLE, Agustín Basave. ¿Qué es poesia? Introducción Filosófica a la poesía. México: Fondo de Cultura Económica, 2002. 

BOMFIM, Renata. Mina. Vitória: Helvética Produções Gráficas e Editora, 2010.

——. Arcano Dezenove. Vitória: Helvética Produções Gráficas e Editora, 2015.

——. Colóquio das Árvores. São Paulo: Chiado Editora, 2016.

—— Coração de Medusa. Vitória: Editora do Autor, 2021.


ESTER Abreu Vieira de Oliveira, professora Emérita da Ufes, atua nas áreas literárias de teatro, poesia e narrativa das Literaturas brasileira e hispânica, com publicações de tradução, poesia, ensaio, crônicas e livros infantil e didático.  Nasceu em Muqui. É Doutora em Letras Neolatinas (UFRJ), Pós-doutora em Filologia Espanhola – (UNED – Madri- ES), mestre em Letras-Português (PUC-Paraná).  Pertence ao Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, à Academia Espírito-santense de Letras, Cadeira 27, atual Presidente, à Academia Feminina Espírito-santense de Letras, Cadeira 31, e a outros segmentos culturais e literários do Brasil e do exterior. Recebeu várias homenagens e prêmios por sua atuação profissional, inclusive o nome do prédio do Centro de Língua para a Comunidade da UFES recebeu o seu nome. Participou de organizações de obras literárias e de congressos estaduais, nacionais e internacionais, e tem várias participações em congressos no Brasil e no exterior.

Renata Bomfim, retrato activo (Pedro Sevylla de Juana)

 

EN EL PRINCIPIO era el símbolo, y el símbolo era energía. El símbolo grande, enorme, universal, estaba formado por símbolos más pequeños; y estos, por símbolos individuales. El conjunto era un mosaico de símbolos de una belleza sublime.

En el principio, el Demiurgo se complacía en la visión del mosaico de símbolos. En su complacencia lo imaginó real y quiso que así fuera. Al símbolo del sol le dio masa y lo llamó Sol. Así hizo con la tierra y todos los planetas; también con la luna y todo lo demás. Los llamó Tierra y Luna, y Cielo y Suelo, y Día y Noche, y Mar y Río y Peces, y Aire y Águila, y Caballo y Árbol y Roca, y Mujer y Hombre. Cuando el mosaico universal y los símbolos individuales que lo formaban tuvieron masa y fueron reales, el Demiurgo les dio unas normas destinadas a mantener el Equilibrio y la Armonía. A esas normas les llamó Leyes Naturales, y se sintió satisfecho. El paso del Tiempo con su roce constante, el Devenir dinámico estableció holguras entre los pedacitos que formaban el Mosaico, y ya nada fue como al principio.

Renata Bomfim, retrato activo

Se miraba Renata Bomfim, joven poetisa capixaba, en el agua del manantial donde lava su cara; y el agua se movía mostrando un rostro móvil, un retrato activo. Supo, la joven artista brasileira el origen del mosaico universal y, en busca de la belleza primigenia de los símbolos, se dirigió al principio. Del símbolo hizo pieza de su mosaico poético, de su mosaico artístico, y poetizando su mundo camina: Transitei por mundos ignorados. /Abracei, com amor, os corpos celestes,/ Reencenei a criação do mundo,….Vi uma imagem refletida/ Na superficie dolente de um lago,/ (Era a minha).

Buscadora de oro en los cauces auríferos, sabe Renata Bomfim que no es oro todo lo que reluce. Encantadora de serpientes, se siente fascinada por la cobra altiva. Le pregunto el proceso artístico y poético seguido y me dice: “Estou muito encantada e feliz em ter o teu olhar sobre a minha arteGeralmente as pessoas esquecem que também sou artista plástica. Embora neste momento me dedique apenas a poesía, entre os anos de 1995 e 2000 eu trabalhei como mosaicista e design de jóias. O mosaico "alegria" é feito com cristais e ágatas brasileiras, ele é uma ode ao momento, um altar para Chronos, deus do tempo. As joias mosaico são uma tentativa de colocar o cosmo no colo das mulheres, uma evocação ás formas e a energia da natureza… Eu sofri um acidente automobilistico (um big bang que sobrevivi), e fiquei impossibilitada por 2 anos de fazer mosaicos, Então, passei a estudar teorias que não exigissem tanto do meu corpo, estudei arteterapia, psicologia junguiana, psicossomática; e todos os caminos que arrisquei seguir me levaram a poesia. Hoje estou completamente recuperada. Bem, eu pinto por prazer mas me sinto mosaicista, e fui aluna e amiga de uma grande mestre, que é considerada a mãe do mosaico brasileiro, o nome dela é Freda Cavalcanti Jardim, ela morreu em 2000. Me dediquei ao mosaico, e dentro do mosaico, ao vitral e a joalheria, te encaminho um link com alguns trabalhos, uma parte muito pesquena do que produzi. Tenho joias espalhadas pelo Brasil e pelo mundo. Mas, isso tudo me parece tão distante, não sei te dizer o por quê... Tudo o que faço é mosaico, até mesmo os poemas são poemas-mosaico. Boa caminhada sobre as águas”.

La poesía es para Renata Bomfim el estaño que une las piezas en el colorido vitral de su vida: avanzar, abarcar, ir, dejar huella, mejorar lo existente, trasformar, crear, amar y ser amada: Poesia é / a palavra / dando cria,/ germinando,/brotando… Sou um soneto/que aquela poeta cantou/ fazendo vibrar a alma…. Vem buscar a palavra./ As letras estão espalhadas/ pelo meu ventre… Busco alento na poesía… Transita no ritmo/ Explode e goza num grito:Poesia!…Ser poeta é cantar alto/mesmo com a voz embargada/... A carência do conto de amor e de dor/ e do romance que ainda não foi escrito/ me fazem ser assim,/ fazem a minha alma ansear pelo mundo/ e me resigna a cumprir a pena de ser poetisa…El poeta, ser plural, asume su propio papel y lo desarrolla con todo su saber y entender: É um mago condenado./ É tantos e todos que é ninguém. Por eso necesita: Banhar-se na chuva mansa, regozijar na tempestade/ e dormir ao relento, onde o frio adensa;buscar veios de ouro e água doce no deserto.

Renata Bomfim parte de la consciencia de Ser, de Existir; punto de apoyo de su palanca. Es y existe integrada en el Universo en expansión, piedrecita del mosaico universal, mas piedra viva y pensante: Eu sou pedra bruta/ girando na ciranda viva/ao som do vento/ e das águas…Sou toda bruma/ rio a deslizar pelos penhascos…,Amo cada centímetro desse chão,/cada fungo, cada inseto… raízes brotam do meu peito e/ saem pela minha boca…Ó felicidade de entender, maior que a de imaginar ou a de sentir! Se esfuerza a diario para ser esa piedra diferenciada que encaje a la perfección en el lugar previsto del mosaico; diseño predefinido entre la naturaleza y ella. Para la poetisa y artista diversa, primero fue el mapa, y con él se trazaron los caminos entre montañas, bordeando ríos: Sigo, amor, numa luta ferrenha/ para ser eu mesma. Encaixando os meus fragmentos/ nas partes do mundo que cabem… Posso dizer que estou / possuída por mim…. Sou eu buscando ar, espaço, acolhida,/ tentando ser gente, precisando de amor… Sou toda dissonância/ Mas busco harmonia/ equilíbrio,/ beleza, cor…Do verde brotam/ movimentos sinuosos,/ sussurros, risos...

Es río Renata Bomfim, río que discurre hasta el mar. Un mar que puede no ser el fin sino el principio de lo nuevo que busca: As ondas me constituem…Elevada das ondas,…/ Bebi sonhos,/Me alimentei de ternura,/ O Sol se curvou por um momento/ O tempo sorriu para mim…Fustigada, ela quer mais... A minha alma anseia,/ ao som do mar, e a luz do céu profundo, ver brotar de ti poesía…Estive olhando o mar/ no horizonte./ Uma linha perfeita/ como jamais serei. Camina, navega, explora y, en las bifurcaciones, quisiera abrir un atajo nuevo en medio de las sendas existentes: mas logo me interroga/a bifurcação…Voo inaugural para uma nova existência. Rehacerse, reinventarse, aunque sin dejar de ser ella, sumando a lo ya conseguido: Adquiri habilidades:/Me disfarço,/ Me misturo,/Posso até desaparecer...

Es consciente la poetisa, artista global, de existir siendo mujer, persona en el camino. Más aún, siendo hembra, pieza esencial de lo creado y de la continuidad humana, esencia receptiva y creadora, recreadora: Sou mulher, portanto,/ a minha alma cintila/, comunga e dialoga / com todas as estrelas ….Nem esposa nem amante,/Namorada!/ É o quero ser/Sonho com o estado de graça/ da mulher que não tem dono,/ que tem asas/ que deliciosamente ameaça voar. Cumplidos en ella los designios de quien todo lo propicia, descansará: até que a noite a cubra /com seu manto de prata. Se une a las iguales por pura hermandad. E eu amo a todas elas!...Nos unem os ciclos da lua,/ a terra do corpo que vibra… Mãe e amante de tudo que vive e respira...

El hombre, fecundador imprescindible, con frecuencia se erige en dueño y señor. Mas o homem não entendeu…Finjo ser…Aquela que precisa ser protegida…Me deixem ser uma mulher de trinta/ assim como sou hoje… Pero ella le quiere amante, compañero, colaborador, amigo: Quero abraçar teu desamparo./Ser tua gêmea, invertida… Arrancas de mim a máscara / sem que eu tenha medo…Companheiro,/ Vamos conjugar verbos…Subverter o alfabeto…Gozar nas texturas plurais.

Canta a la sensualidad y al milagro repetido de la maternidad; y su canto es apremiante. Cava o meu chão e/ planta a tua semente…Habitei o templo da luxúria...O tátil se apoderou de mim!...Te submeto aos meus desejos mais indecentes…,/Sou terra úmida/ à espera da tua semente, como se fosse a última….lascivos e exaltados,/ nos devoramos até não sobrar nada…Eu quero rebentar!... ele nasce/ brota do meu ventre acetinado:/ um filho com olhos de luz…Mulher, fêmea, / meu nome/ é prazer…A carne apodrece de tanta doçura,/ as palavras, torrões, desenham cadeias de montes,/ cujos picos, cobertos de açúcar, convidam.

La soledad y la búsqueda en la poetisa y artista capixaba se hacen cuestión vital. Busca fuera lo que tiene dentro; y lo busca para llenarse de lo que ya está llena: Estou morta, mas/ pensem que fui viajar….Sinto fome de infinito…O vazio me invade:/ Resto plena de tudo o que não sou eu…Ser poeta…É buscar o outro/ e encontrar a si mesmo. Foi em busca do seu sol/ e do sentido que o fará um dia/ emergir deus. /A solidão é um abismo/ e guarda uma paz preciosa!... Falta de algo ou de alguém... Busco Ítaca!/ Busco a minha alma/ na alma daquela que tece à espera…En ocasiones alcanza conciencia de su propia diversidad y, aunque en broma, se siente llena de ella misma: Confeccionei bibelôs em gesso,/ elaborei mosaicos dos infernos,/ tão belos que Gaudí invejaria./ Criei joias, contei histórias, pintei, / bordei, toquei violão, fiz mandingas,/ macumbas. Aprendi dança de salão, /dança do ventre, escrevi versos.

Renata Bomfim ama lo lejano y ama lo próximo; ama al otro, al congénere, al amigo fraterno, al desconocido sospechado, intuido. onde o amor impera, o/ sacrifício é sacro, é santo,/ ofício de doação per se./ Que surja uma nova era,/a era das rosas, era de ouro, /era de mim e do outro, era de nós…. Despertar os sentidos/ adormecidos/ ser um deles…ser um com ele/ um com ela…Somos um todo!... Quero abraçar teu desamparo, sim! / Acolher a dor que mora dentro,/ curar as chagas, deixar ir. Sufre con él oprimido, con él se resiste; y pide a quien corresponda el cese del dolor inútil: Tememos!/ Trememos!...Alivia-me dessa dor!/ Seca o sangue que escorre e corre…Alivia-me do grito que está preso nas entranhas! Liberta-o!... Prefiro a morte à sujeição.

Ve la existencia humana, eterna y hecha de existencias temporales. Está dispuesta a creer, necesitada de creer en algo que sirva de sostén y agarradero. Ve un Dios inconcreto, que a veces es plural, con su obra como testimonio y el respeto generalizado como moral única. Respeitosamente espero a chuva cair…Tenho uma sede insaciável/ De Deus.../Por isso bebo a flor e o orvalho…Preces e rogos e oferendas / Para um deus pagão…Mulher peca nua,/ santamente./ Seu gozo resgata do purgatório…Visto roupas brancas e puras/ e ouço mantras transcendentais…Neste caminho que é a vida/ sou levado a buscar o nirvana,/ a estar com todos os chakras alinhados…Vou mandar rezar uma missa/ Para que me deixes descansar/ e para que também descanses…Dios está onde se tangenciam natureza e poesía.

El paso del tiempo huero, la temida rutina la llevan a hacer, a transformar: Assim o cotidiano invade a carne,/ um dia após o outro: mata as células, esmaga os sonhos.   Mas dos dedos brotam letras/ que não se repetem jamais! Las manos, al servicio de la mente, sirven para dar vida a mosaicos y vitrales, diseñar joyas, unir pedazos de espacio, de vida: Rompeu-se o que era de ouro e fino e delicado./ Brocado de oníricas texturas.., Catedral envidraçada,/ Templo óptico… ouro e mercúrio/ Amalgamado no espelho cruel de Narciso… ser fragmento/ no mosaico cósmico…

Lugar de acogida su espacio para los seres vivos. Piedras, árboles, animales; y todos con sus derechos. Algunos, como los gatos, alcanzan el honor de tener poemas escritos o dedicados. A Lili, Verinha, Elvira, Elvis,/Elvis Júnior e Dedo… Busco o natural/ nos escombros e resquicios/ do animal que sou… Acredito que você é um anjo/ uma gatinha-querubim./Eu a quero pra sempre perto de mim... Amigo macio e misterioso,/ o que anima a tua essência?/ Qual motivação divina te fez assim:/ Astúcia, graça e beleza? Se considera Renata Bonfim parte de un todo universal, sufre en lo profundo el daño que la naturaleza recibe del hombre y sabe que herir a una parte es herir el todo, el hombre incluido: É obsceno produzir lixo em profusão,/ degradando a natureza. Letargia/ Consumo/ A terra agoniza,/ o gemido é visceral… De tanto arranhar a Terra e violar os Rios/ ofendendo o grande Nada.

Renata Bomfim se ríe con las cosas más serias; y con las menos. Uno de los poemas que la muestran humorada se llama Juramento de Hipócritas; y jura abrir uma clínica na Enseada do Suá,…para atender senhoras e senhores/ da alta sociedade…Juega con las palabras, sonidos y significados. Mote/ o trote/ o xote/ vou seguindo/ sou essa alma que grita/ Inspirada!/ cobra pronta a dar o bote

Humana hasta la médula y persona social, se mueve entre el temor y la esperanza, entre la aceptación de la realidad y el deseo de cambiarla: Dores e lágrimas, / medos inexplicáveis/até mesmo da plenitude e/ da felicidade…. O homem se pega em desatino,/ a sua vida será labor e sacrificio… Sigo vencendo o medo da morte…¡Oh, Dios! ¿Qué dolor es ése que/ parte de lugar que desconozco/ y viene a alojarse aquí dentro,/ haciendo de mi pecho cuna, celda, cementerio?... Experimentei da dor, da violencia/ da solidão... da amizade e de incontáveis alegrias….E amei, amei...

Creativa inteligente, encuentra un bello modo de contarnos que hasta en sus preferencias hay grados: Com Freud e Lacan, muito sexo./ Flerte com Foucault. /Com Bakhtin, pura amizade./ Mas com Jung, amor./ Com Deleuze, um chá a tarde, /Com Baudelaire, cigarro, rapé, campari./ Conselhos, tomo com o Jameson, /Mas sigo sempre as dicas do Paz./ Sedutores pirados, visionários, poetas, / Combinam bizarrices e genialidade, / Roubam meu tempo, minhas letras e /Partem falando de mim. Fica a saudade.

De cuando en cuando, en su poesía da pinceladas de su poética: Sonhei escrever um poema/ impossível, marcante e forte/ cujas letras estivessem prenhes de espírito/ a musicalidade fizesse vibrar a carne e, o metro,/ reproduzisse a perfeição do infinito…./ Mas como cantar a beleza bruta,/ que se revela apenas em lampejos?.....A natureza escreveu o meu poema:/ Traçou nas linhas da roseira/ metrificou o caminho da formiga/ e às rosas perfumadas/ foram embaladas pelo ritmo do vento…

Hay una ventana abierta en su vida que ella llama Letraefel. Renata Bomfim abre ese blog de par en par para ver el mundo cuando el mundo entra. Letraefel es un diario que ella escribe para que lo lean quienes tengan la suerte de llegar. En esas páginas virtuales deja, junto a las entregas de otros, retazos de sí: piel, carne y hueso arrancados de su ser más íntimo. Con ellos y sus libros de poemas he podido esbozar el retrato de la poetisa, artista diversa y creadora global. Pero siendo un retrato activo, vivo; es preciso situarlo en el entorno en que nace, crece y se reproduce su poesía.

La poesía en portugués, en opinión tan autorizada y experta como la del poeta, traductor, ensayista, crítico y periodista carioca y universal Ivan Junqueira, es superior a la que se escribe en otras lenguas. No es sólo cuestión de lengua, aunque la lengua portuguesa, por su estructura y morfología, da facilidades a la lírica. También influye la oportunidad histórica y la trayectoria seguida por los poetas anteriores. La pedagogía será otro elemento favorable; y el número de practicantes.

En cuanto al número de poetas podemos decir que es muy abundante en Brasil. Mujeres y varones por igual; baste mirar la extensa nómina de poetas capixabas. El fenómeno internet y la consiguiente facilidad de publicación hace que el concepto de poesía se amplíe y quepan en él poemas que antes no tenían hueco. De la cantidad también proviene la calidad. Las revistas de poesía y los blog personales, están siendo promovidos por poetas que gozan de pasión poética y generosidad para con los afines.

Todos los estilos, todas las tendencias y corrientes conviven. Puede apreciarse la lucha intemporal entre renovación y permanencia. La traducción a otras lenguas nunca ha sido tan dinámica: a las romances en primer lugar, pero también a otros grupos lingüísticos. Es un fenómeno que está siendo positivo para la divulgación. Caso excepcional es la simbiosis entre la poesía en español y la poesía en portugués. Lenguas hermanas, permiten una convivencia y un trasvase inimaginable hace décadas.

Renata Bomfim es poeta de su tiempo, agitada por su tiempo, mecida por su tiempo. Y todo lo que ocurre la afecta. Se exige porque la exigen lectores y críticos; no escribe poemas porque los puede publicar; los poemas la escriben a ella, la saltan al regazo y se abrazan al cuello, le obligan a crearlos, la fuerzan a escribirlos, y siente un desgarro al separarse de ellos, al cortar el hilo umbilical que los alimenta. Cuánta sabiduría, cuanto conocimiento, cuánta belleza hay en la poesía de Renata Bomfim, cuánto sentimiento, cuánta universalidad. Piedra, agua, viento, fuego. Los cuatro elementos en danza. A la poetisa brasileña le mueve, así lo tengo constatado, ese deseo enérgico de alcanzar las estrellas desde las raíces de sus pies.

La poesía de Renata Bomfim, además de en los grandes autores de la cultura en portugués,  bebe en El Cantar de los Cantares, en Virgilio, Horacio, Fray Luis de León, Bodelaire, Verlain y fuentes muy diversas. Por eso busca el paraíso y vive en él: Letra e Fel, montañas capixabas, Ilha de Vitória, continente Brasil. Sus pensamientos, sus intuiciones, ese deseo irrefrenable de ir hacia lo desconocido, se expresa mejor en lo simbólico, mosaicos circulares que tienden a la elipse sin ella saberlo, joyas que adornan mujeres de cualquier país.

Puede pensarse que las coincidencias con Florbela Espanca son influencias recibidas de la portuguesa en los largos años de admiración. En mi opinión, ambas mujeres coinciden en la manera de abrir camino a la feminidad. Admiración es lo que siente Renata Bomfim por el gran Rubén Darío: agudeza, brío, arrebato, osadía y rebelión. Tras sus pasos y su esencia fue a Nicaragua; regresando cargada de belleza y energía. Admiración por la valerosa, crecida y capaz Rosalía de Castro y sus coincidentes miradas sobre lo propio. Ahí se encuentra con la inmediatez de Juan Ramón, la oscura acuarela de Bécquer y las soledades inconclusas de Góngora. Se encuentra a gusto charlando con Octavio Paz. Lorca es enlace con otras poesías. Los místicos la llaman: Teresa de Ávila y Juan de la Cruz.

Lo ibérico, hispano y luso tan iguales y tan distintos, resulta esencial para la poetisa capixaba. Ella lo amalgama y lo funde con lo recibido, sentido y amado de los poetas brasileños. Castro Alves, Manuel Bandeira, Cecília Mireles, Drummond de Andrade, Dos Anjos, Raul Bopp, Guimarães, Coralina, Guilherme de Almeida y tantos otros reciben su mirada indagadora. Aunque, es preciso destacar, que bebiendo en fuentes de cualquier lugar y época, no sigue corrientes establecidas ni modas temporales. Los ríos poético y artístico de la volitiva Renata Bomfim, labran su propio cauce de manera espontánea: hace ella lo que desea hacer, y va adonde, en cada momento, quiere ir.

En el principio era el símbolo, y el símbolo era energía en estado puro. Supo Renata Bomfim, joven artista brasileira, el origen del mosaico universal y, en busca de la belleza primigenia de los símbolos, fue al arranque de todo. Del símbolo hizo pieza de su mosaico poético, de su mosaico artístico y vital; y poetizando el mundo de búsqueda, camina en pos de su exuberante y multifacética identidad.

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Pedro Sevylla de JuanaAcadémico Correspondiente de la Academia de Letras del Estado de Espírito Santo en Brasil, Pedro Sevylla de Juana desciende de agricultores y artesanos de la forja. Nació en Valdepero, provincia de Palencia, el día 16 de marzo de 1946. Terminado el bachillerato superior en el colegio de La Salle de la capital palentina, se hizo publicitario en la Escuela Oficial de Publicidad de Madrid. Cursando, luego, en ICADE, los estudios de Dirección de Márketing; que pudo compaginar con los de sicología, fotografía y diseño gráfico. Perteneció a varias empresas multinacionales de primer rango, hasta que, antes de cumplir los cincuenta, dejó el último trabajo, Jefe del Departamento de Publicidad de un fabricante de coches, para dedicarse a escribir a tiempo completo. Aficionado a la lectura, y deseoso de fijar al papel sus hallazgos y contrariedades, escribe desde muy temprano. Se rindió a la poesía sin condiciones, y la prosa poética fue el resquicio por donde le llegaron los relatos breves. Ellos, y las sorprendentes facilidades del procesador de textos, le acercaron, ya asentado en la madurez, a la novela. El interés por la lengua y la cultura portuguesas, posibilitó su actividad de traductor y el regreso a la poesía. El descubrimiento de Brasil, la desbordante vitalidad de ese país enorme: geografía, historia, miscigenação y cultura; supuso un impulso para su trayectoria literaria. Colabora en diversas revistas digitales de Europa y América, tanto en lengua castellana como portuguesa. Tras dejar su pueblo y Palencia, residió en Valladolid, Barcelona y Madrid; pasando temporadas en Cornualles, Ginebra, Estoril, Tánger, París, Ámsterdam, Villeneuve sur Lot (Aquitaine) y Vitória ES (Brasil). Viajero intermitente, pasa la mayor parte del tiempo en El Escorial, dedicado por entero a sus tres pasiones más arraigadas: vivir, leer y escribir. Frutos de esa ocupación son los veinticuatro libros publicados. Escritos suyos figuran en seis antologías internacionales. Su último trabajo publicado se titula BRASIL Sístoles y Diástoles. Es un libro de relatos y poemas bilingüe en castellano y portugués. La cubierta tiene dos entradas, una por cada idioma, y las ilustraciones son dos cuadros representativos de ese país enorme: de su historia, de su geografía y de su cultura; pintados por Tarsila do Amaral: Morro da favela y Abaporu.

30/03/2023

A mulher na Academia de Letras (Prof. Dr. Francisco Aurélio Ribeiro)


Há, exatamente, um ano, falecia a jornalista e cronista Jeanne Bilich, ocupante da cadeira 7da Academia Espírito-santense de Letras, vítima de câncer pulmonar. Sua vaga no coração de seus poucos e fiéis amigos jamais será ocupada, mas a da AEL, por tradição, o foi, pela artista plástica, professora e ambientalista Renata Bomfim, eleita em dezembro passado. Foi uma posse repleta de simbolismos, com distribuição de mudas de pau-brasil, leitura de poemas e músicas na voz suave da cantora Aline Maria. 

Uma noite memorável acontecida no mais recente espaço cultural no coração de nossa cidade, o Triplex Vermelho, na Praça Costa Pereira, não por acaso o Patrono da cadeira ocupada por Jeanne e Renata. E, também, pela primeira vez, em seus 102 anos de existência, uma mulher sucedeu a outra na AEL.

Renata Bomfim, doutora em Letras, nasceu na Ilha de Vitória, em 1972. É uma ativista na causa ambiental, atua como gestora de projetos socioambientais e criou a Reserva Natural Reluz, com o objetivo de proteger o remanescente capixaba da Mata Atlântica, onde desenvolve trabalhos de educação e proteção ambiental, em parceria com o marido, Luiz. Preside, também, o Instituto Ambiental Reluz, de cuja diretoria também faço parte, junto com Ester. Na área da literatura, fez pesquisas em Portugal, focando os estudos na poetisa Florbela Espanca, e na poesia ibero-americana, sobretudo a de Rubén Darío. Presidiu a Academia Feminina Espírito-santense de Letras, período em que também realizou a 6ª Feira Literária Capixaba, na Ufes.

Como escritora, além de fina ensaísta, Renata é, essencialmente, poeta. Seu último livro, “O Coração da Medusa”, foi premiado no edital da Secult, em 2021; antes dele, publicou “Mina”, em 2010, “Arcano Dezenove”, 2011 e “Colóquio das Árvores”, 2015. Possui publicações em antologias no Brasil e no exterior e é fundadora da Revista Literária Letra e Fel, on-line, desde 2007. É professora universitária, ex-presidente da AFESL e membro efetivo do IHGES. Renata é uma mulher do seu tempo, militante política engajada nas causas sociais, uma árvore que dá frutos. Por isso, recebe críticas, como todo mundo que se atreve a contrariar o establishmentneste país onde as diferenças sociais estão entre as mais gritantes do mundo.

Renata é a décima-quarta mulher a entrar na Academia Espírito-santense de Letras, desde a pioneira, Judith Leão Castello, em 1981. Atualmente, elas são oito, dentre os quarenta ‘imortais’, um quinto do total. E não é fácil para as mulheres entrarem na Academia. O preconceito contra elas e a misoginia como ranço acadêmico são, também, uma herança greco-latina. Célebres são os aforismos de Eurípedes, “Odeio a (mulher) inteligente; é antes nas espertas que Afrodite inocula o pecado; as imbecis são preservadas dos desejos loucos pela curta extensão da inteligência” e de Petrônio: “Confia o teu barco aos ventos, mas não confies tua alma às meninas, porque a onda é mais segura que a fidelidade da mulher”.

Com o objetivo declarado de se dedicar à “cultura da língua e da literatura nacional”, fundou- se, em 1896, no Rio de Janeiro, a Academia Brasileira de Letras, constituída por quarenta membros, como a Academia Francesa em que se baseou, sendo todos homens. De acordo com os estatutos da ABL, “só podem ser membros da Academia os brasileiros que tenham, em qualquer dos gêneros da Literatura, obras de reconhecido mérito ou, fora desses gêneros, livro de valor literário”. Durante mais de oitenta anos, a ABL impediu a entrada de mulheres em seu meio, interpretando os “brasileiros” do seu regulamento como, exclusivamente, os do sexo masculino. Quando a Academia Espírito-santense de Letras foi fundada, em 1921, não foi escolhido nenhum nome feminino. A escritora capixaba Guilly Furtado Bandeira, já acadêmica no Pará desde 1913, não foi lembrada para compor o sodalício, embora um de seus primos, Manoel Pimenta, estivesse entre os primeiros acadêmicos.

Renata Bomfim é a décima-quarta acadêmica a entrar nos umbrais da AEL e a primeira a suceder outra mulher. Dos 179 Patronos e Acadêmicos da AEL, desde 1921, apenas 14 são mulheres, número bastante pequeno, se comparado à importância que as mulheres têm no cenário cultural e artístico do Espírito Santo. Essa representatividade mínima não é diferente, se lembrarmos que, também na Assembleia Legislativa, as mulheres capixabas são quatro, dentre trinta; no Congresso Federal, duas, dentre dez, e no Senado, nenhuma. A luta pela afirmação política e social das mulheres ainda é constante e o cenário é apenas um pouco melhor do que o vivido pelas mulheres do século XIX, que não poderiam se destacar, para não, se tornarem “mulheres públicas”.

(Texto originalmente publicado na coluna do Professor Francisco no Jornal A Gazeta)