Seja bem-vindo(a). Este é um espaço pessoal onde, desde 2007, reúno poemas, ensaios e artigos de minha autoria, compartilhando também um pouco da minha trajetória como terapeuta junguiana e ativista ambiental. É um espaço aberto, para escritores(as) de várias partes do mundo.

12/10/2009

DESVAIRADOS E RACIONAIS: DOIS MOVIMENTOS E UMA CIDADE INSPIRAÇÃO (Andressa Zoi Nathanailidis)

Amigos, no dia 09 a nossa amiga Andressa defendeu a dissertação de mestrado  intitulada: Desvairados e Racionais: dois movimentos e uma cidade inspiração, este texto mostra a riqueza da pesquisa:

Ao promover um estudo acerca da importância de Mário de Andrade na constituição do legado identitário brasileiro, deparei-me com um vídeo que me chamou bastante atenção. Nele, um grupo paulista de rap (Urbanos MC’S), se apresentava “cantando” poemas de Mário de Andrade. Ao assistir o vídeo, percebi então que, na voz rapper, o texto modernista, produzido há quase um século, parecia bastante atual.  Instigada a compreender o que ambos os discursos (rapper e poético) continham em comum, ao ingressar no curso de mestrado, decidi conceder um recorte ao tema; promovendo uma análise comparativa sobre o “olhar da cidade”, em textos esparsos produzidos por Mário de Andrade e Racionais MCS; este último considerado um dos maiores expoentes do rap paulista. Devido à amplitude do “corpus literário”, concentramos nosso estudo em duas obras, produzidas em momentos diferentes da carreira do autor modernista: Paulicéia Desvairada (1921) e Lira Paulistana (1941). Já em relação a Racionais MCS, foram selecionadas canções avulsas, cuja temática versasse sobre “a cidade”. Após uma breve introdução na qual expusemos nossos objetivos e algumas considerações acerca da cidade e do fazer literário, formulamos questionamentos que ajudaram a determinar as divisões capitulares da dissertação; como por exemplo: como ocorreu o processo histórico que envolve a criação e o desenvolvimento de São Paulo; sob quais bases foram instituídos o Hip-Hop e o Modernismo; de que maneira a linguagem é trabalhada nos textos destes dois movimentos; como eles se estabeleceram em São Paulo, que objetivo continham e a que público se destinavam? Dividimos a dissertação em quatro capítulos, sobre os quais falaremos brevemente. São Paulo: Breve Histórico, o primeiro capítulo, traz um pouco da história da metrópole. Fundada em 1553, São Paulo é fruto da fusão de dois conglomerados: a Vila Histórica Santo André da Borda do Campo (governada por João Ramalho) e o Colégio Jesuíta (fundado por Manoel de Nóbrega). Cidade modesta até os fins do século XVIII, São Paulo atravessou momentos políticos e econômicos que transformaram seus aspectos físicos e sociais. No século XIX, por exemplo, à época do Império Brasileiro, tivemos o “Ciclo do Café” que trouxe à cidade um aumento populacional (através dos imigrantes), a expansão do comércio e de seus limites. A essa época, foram inaugurados os primeiros marcos da urbanização paulista, como por exemplo: Cemitério da Consolação (1858), Estrada de Ferro Santos-Jundiaí (1867), Avenida Paulista (1891), Viaduto do Chá (1892), etc. Em função de crises diversas, a economia cafeeira precisou ser substituída pela atividade industrial, que alterou ainda mais a cidade. Atraídos pela possibilidade de emprego, muitos migrantes chegaram ao local, aumentando consideravelmente o número de habitantes. A cidade, que antes não contemplava muitas divisões sociais, adquire agora novos elementos em sua estrutura física e social. Surgem os operários e “suas” periferias, caracterizadas pela precariedade de serviços oferecidos. No decorrer do século XX, os níveis paulistas de segregação social aumentaram cada vez mais, culminando no surgimento das favelas, na década de 1940. Sobre esse novo elemento, há que se dizer que era geralmente habitado por descendentes de negros que, encontravam muitas dificuldades para se inserir no mercado de trabalho e ter condições de pagar o aluguel, ainda que de casas mais simples ou cortiços. A história do povo negro, ganha neste capítulo, uma seção especial, na qual estudamos um período extenso, que vai desde o início do tráfico de escravos (1530) até a abolição da escravatura e conseqüente exclusão social deste povo (1888). Ao final do primeiro capítulo notamos ter percorrido a trajetória de uma cidade que se tornou, ao longo dos anos, cada vez mais “guetizada”, senhora de muitas realidades capazes de inspirar releituras diversas, acerca da mesma. No segundo capítulo, São Paulo Inspiradora das Artes, procuramos verificar as origens das releituras analisadas na dissertação. Para compreender um pouco mais sobre o Modernismo e o movimento Hip-Hop, foi necessário caminhar até suas essências. Constatamos que o Modernismo, na verdade, decorre de outro movimento artístico, nascido na Itália: o Futurismo, cujos princípios (exaltação à guerra, ao poder da palavra, às máquinas, combate ao academicismo, inovação artística, etc.), não foram adotados em sua totalidade no Brasil. Já em relação ao Hip-Hop, também foram descobertas origens distantes. Resultado de tradições jamaicanas, o movimento passou pelos Estados Unidos; sofrendo um percurso considerável de modificações até que ocorresse sua disseminação mundial e conseqüente chegada a São Paulo. Ainda neste capítulo, pesquisamos acerca da ligação histórica existente entre música e poesia; destacando os primeiros indícios ainda no século VII a.C., seu desenvolvimento na Idade Média (por meio dos jograis e trovadores), o surgimento do Teatro Musical (no Séc. XIX), dentre outros. Procuramos, também, compreender de que maneira é constituído o RAP, suas influências, peculiaridades sonoras e lingüísticas; bem como sua aceitação no meio acadêmico e social. Estivemos diante de opiniões totalmente contraditórias, provenientes de personalidades do campo da música e das letras; como Chico Buarque, Júlio Medaglia e Marcelo Mirisola. Após termos constatado ser o rap uma manifestação bastante polêmica, passamos, então, ao terceiro capítulo, destinado à compreensão e análise da obra de Mário de Andrade. Intitulado A poesia de Mário de Andrade: o Arlequim, a Lira e a cidade, o capítulo traz uma breve biografia do autor, seguida, primeiramente da análise de Paulicéia Desvairada. Lançado em 1922, o livro demonstra a consciência do autor acerca do poder da palavra. A análise dos poemas revelou características, como um caráter sensorial muito grande. O poeta, que vive os primeiros anos da industrialização na capital paulista, mergulha na literatura: ele é o narrador- arlequim que, como um flâneur, desvenda a cidade, tomando para si, as características de um ambiente múltiplo. O caráter humanitário dos poemas e a alegria de viver em São Paulo são confrontados com a ameaça industrial, a indiferença burguesa e as críticas ao sistema. Na linguagem, a utilização seqüenciada de termos contraditórios (como “luz” e “bruma”) é também uma constante evidência. Se tivemos em Paulicéia Desvairada a esperança de evitar o crescimento dos primeiros problemas oriundos da industrialização na capital paulista, o mesmo não ocorre em Lira Paulistana. Publicada em 1945, a obra fora escrita num período onde os números relativos ao índice de segregação sócio-espacial da capital paulista, já eram elevados. Apesar de guardarem em si características de ampla musicalidade, os poemas de Lira Paulistana retratam um “eu” sombrio, cuja postura niilista já não dá lugar à esperança de uma sociedade mais justa. Ao ver “sua” São Paulo transformada, o narrador-poeta que ainda é consciente do poder de suas palavras, vê-se como elemento frágil diante de um poderoso sistema, responsável por modificações contínuas, tanto na cidade física, quanto nos habitantes que a ocupam. O livro contém a certeza da existência de um sistema que cultiva, em meio à população, a apatia e automação de comportamentos indiferentes. Nesse aspecto, chama atenção, no livro, a utilização do elemento “garoa”, enquanto metáfora da desigualdade (“garoa sai dos meus olhos”). Eis que, então, chegamos ao último capítulo da dissertação: O Rap de Racionais MCS. Assim como no anterior, após breves considerações sobre o grupo, passamos à análise das letras, cujo resultado é o retrato de uma metrópole completamente segregada, cujos graus de automação e indiferença parecem ter atingido seu estopim. A análise das letras reflete um simulacro do cotidiano. A cidade é colocada na condição de campo de guerra, sendo as criticas ao sistema e à indiferença social, fatores constantes. Mais uma vez, a garoa aparece na condição de metáfora da desigualdade (“a garoa rasga a carne”) e diante do “holocausto urbano”, a “palavra” surge como saída e elemento de orientação. Ela resgata identidades, persuade e convoca seus “fiéis” a uma postura cívica, distante da apatia instituída pelo sistema capitalista, ao longo de tantos anos. Uma postura cujo objetivo é resgatar não só o destino de pessoas, mas também do espaço físico, que tanto é “espaço-caos”, quanto “espaço-amado” (“Porque esse é o meu lugar... mas eu o quero mesmo assim”...) Ao passarmos para a conclusão de nosso trabalho, constatamos que as manifestações poéticas nele estudadas mantém um diálogo intenso com a realidade (à semelhança do que nos diz Bakhtin, em sua teoria do dialogismo) e acompanham, de certo modo, o desenvolvimento histórico da capital paulista (desde a chegada da industrialização à segregação total da mesma). Lançamos alguns questionamentos ousados, como: teria o rapper, em sua condição de pobreza, a capacidade de agir como um flâneur (já que enquanto as camadas mais abastadas permanecem confinadas em seus “guetos” de segurança, esse por falta de condições, percorre as ruas da cidade, explorando, conhecendo e sentindo mais o seu espaço. )? Seria ele agente de um novo movimento estético que, de certa forma retoma à sua maneira princípios futuristas de Marinetti, como a exaltação da guerra por meio da palavra e o agir coletivo dos jovens? Sem pretensões de responder a tais perguntas, concluímos, pois nossa pesquisa; na esperança de termos realizado uma abordagem diferenciada que talvez, futuramente, possa servir como referencial para outros trabalhos.

Banca Examinadora:
Prof. Dr. Jorge Luiz do Nascimento – UFES (Orientador)
Prof. Dr. Wilberth Claython Ferreira Salgueiro – UFES (Membro Titular)
Profª. Drª. Janice Caiafa Pereira e Silva – UFRJ (Membro Titular)
Prof. Dr. Sérgio da Fonseca Amaral – UFES (Membro Suplente)

Se este tema te interessou entre em contato com Andressa:
http://letrasaopiano.blogspot.com/

3 comentários:

Andressa disse...

Obrigada pela divulgação, Rê!
:)
Adorei tê-la comigo nesse momento de "tensão"..hehehehe!
Postei fotos no orkut!
" Amigas do mestrado para a vida toda"
um beijo grande,
Andressa

Anônimo disse...

Huahuahuahuahua!!!! Propaganda gratuita da DEDE!!!! Realmente essa pesquisa foi muito interessante, sou suspeito para falar.... sou amigo....hehehe!!!!
Kisses Renata
Kisses da Mamma!!!!

Renata Bomfim disse...

Olá amores... que delícia ter vocês por aqui!!! voltem sempreeeeeeeee
Beijão da amiga do vinho branco (ehehehe)
Renata