Eu ainda assistia a
novelas quando conheci Elisa Lucinda. Lembro-me de alguém dizer “olha, uma
atriz capixaba!”. Daí a conhecê-la como poeta foi um salto no tempo, meu
mergulho na literatura é recente. Mas não foi lendo, e sim assistindo a uma
maravilhosa declamação de seus versos,
com toda sua alma. Se não sabem
do que estou falando, procurem por sua performance de “Mulata exportação”.
Elisa nasceu em
Vitória, Espirito Santo, ao meio dia de um domingo de Carnaval, no dia 2 de fevereiro de 1958, dia de Yemanjá.
Não é à toa que poetiza sobre as águas, como em “Amor de Odoyá”, “Inocência” e
“Rio melhor”. As águas da chuva, dos rios, do mar, perpassam suas memórias,
suas paixões, suas palavras. “Toda lágrima deveria virar palavra”, diz em
“Escrito d’água”, “Aproveite a lágrima, faça ela render.”
No poema “Uma vitória”,
Elisa Lucinda rememora um momento em que declamou versos na Festa de São Pedro
de 1999, dividindo o palco com a cantora e sua madrinha Beth Carvalho, a quem
dedica o poema. “Minha terra me amava, o Espírito Santo me amava, caí no chão
do camarim, de muita emoção eu chorava.” Um relato que nos revela a construção
da identidade de uma artista diante de sua terra natal.
Poeta, atriz, jornalista,
cantora e professora, Elisa é uma das fundadoras da Casa Poema, no Rio de
Janeiro, para onde se mudou na juventude. O projeto, com oficinas e saraus,
atende a um público diversificado e acredita na poesia, especialmente a falada,
como uma forma de melhorar a qualidade de vida das pessoas. Em diversos poemas da
escritora, encontramos a reflexão sobre o fazer poético, sobre a palavra que
nasce, cresce, grita e não morre dentro da gente. E é dessa necessidade de
transbordar a palavra que essa poeta capixaba nos faz crer que escrever é para
todos, nos convida a poetizar porque acredita que a palavra, nascendo do
sentimento de cada um de nós, é estrada para o outro.
A poesia de Elisa
Lucinda não tem enigmas ou rebuscamentos. De forma simples, direta e bela, fala
de amor e paixão, de dor e frustração, de preconceito, violência e morte. Fala também
de delicadezas de toda sorte. Versa sobre a natureza, a amizade, o desejo e a
saudade; a mulher, o negro, a mulher negra na sociedade. Racismo, sexismo,
pobreza: para esses temas, não convêm sutilezas. Elisa rasga o verbo, desnuda a
alma, traz à tona todas as vozes guardadas nos convidando a dialogar, a
compartilhar, a multiplicar. Sua escrita revela aquilo que vai no peito, aquilo
que nunca finda. E pode ser no seu, no meu, no de Lucinda.
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