A historiadora Michelle Perrot (1988) chamou a atenção para o fato de o feminismo ser difundido historicamente como um movimento social e não político, o que reproduziu a ideologia de que política não é assunto para mulheres. Outra ideia enraizada é de que a mulher foi excluída do trabalho. Como vimos em estudos anteriores, a mulher não foi excluída do campo de trabalho, sua ação foi regulamentada pela ideologia dominante e seus lugares de atuação definidos.
No século XVIII as mulheres tornaram-se potências produtivas domésticas, ao contrário dos homens que eram trabalhadores mercantis. As mais pobres produziam em casa, artefatos que eram vendidos no mercado, já as burguesas, trabalhavam para seus maridos, muitas vezes realizando os mesmos serviços que seriam muito bem remunerados, caso fossem homens. A condição da mulher desse período era a de prisioneira da família e sua mão de obra era não remunerada. A exclusão feminina do mercado de trabalho dava aos maridos operários, seguridade.
O movimento feminista a partir de 1848, caminhou em muitas direções despertando uma forte onda anti-feminista. Os sindicatos masculinos passaram a lutar para que as mulheres não tivessem acesso ao mercado de trabalho e contestavam a luta operária feminina tentando desarticular os movimentos organizados feministas, chegando a fazer greve quando mulheres eram contratadas. Os homens exigiam que o trabalho feminino fosse extinto, um problema que, segundo M. Guilbert (1982), “se colocava idêntico em todos os lugares”. Não podendo deter o avanço das mulheres, os partidos sexistas, passaram a criar legislações que limitavam a atuação do tempo da mulher no mercado de trabalho.
O movimento feminista foi um divisor de águas na historia de resistência da mulher, lançando base para conquistas que só se consolidariam no século XX. Além da luta por direito a educação e igualdade com o outro sexo, as mulheres do primeiro quartel do século XIX, se engajaram na luta pelos direitos dos menos favorecidos, assim, o movimento feminista se ligou à luta pelos direitos das minorias étnicas e pela paz. O principal veículo de difusão dos ideais feministas das mulheres de classe média foi a imprensa. As mulheres do século XIX “constituíram uma importante vanguarda dos movimentos sociais participando das doutrinas e movimentos revolucionários”. Segundo a pesquisadora Karina Fleury, no século XIX a família tornou-se a instituição social “moderadora e modeladora da moral”, não agradava a igreja que as meninas fossem educadas em casa, as famílias de posse, tinham como alternativa, enviar as filhas “casadouras” ao convento, onde receberiam formação diferenciada das destinadas à vida religiosa, e aprenderiam latim e música; bem como a ler, escrever, contar, coser e bordar, educação, educação bem diferente da recebida pelos meninos, as meninas pobres não tinham acesso a educação.
A violência para com a mulher pode ter gerado uma nelas insegurança e medo, fatores que podem ter desencadeado o imobilismo. Percebe-se que algumas mulheres introjetaram os valores falocratas, e se tornaram uma espécie de guardiãs da moral e dos costumes, outras, porém, resistiram e passaram a se fazer ouvir. Reduzida ao âmbito privado a mulher do século XX, passou a defender e a supervalorizando a identidade que lhe foi conferida, de esposa e mãe, e foi desse lugar que ela esperava respeito e aceitação. A valorização do papel de mãe foi uma tática utilizada como mecanismo de controle da mulher do século XX.
Dentro deste panorama, que lugar ocupou a mulher que não se enquadrou nesse modelo? Perrot em Os excluídos da história (1988), relata que no inicio do século XX, a Europa foi tomada por um sentimento anti-feminista, poia a “nova Eva” reivindicava igualdade de direitos civis e políticos, o acesso a profissões intelectuais e recusava, justamente, confinar-se à vocação materna. Ela suscitou o fervor daqueles poucos que sonhavam com companheiras inteligentes e livres, porém, mais generalizadamente, o medo daqueles que temiam ser desbancados e viam nessa ameaça do poder feminino o risco de degenerescência da raça e de decadência dos costumes.
A inserção da mulher na ordem do discurso, fez com que a voz feminina, com seu discurso prenhe de subversão, passasse a ser alvo de normatização, o discurso feminino passou a ter que se submeter a determinadas regras de funcionamento, bem como, àquelas que os o pronunciavam. Sua circulação, e publico também passaram a ser monitorados e restringidos. Como afirmou Foucault (2006), “ninguém entrará na ordem do discurso, se não satisfizer a certas exigências, ou se não for de início, qualificado para fazê-lo. As mulheres burguesas, reivindicaram para si outros lugares, e embora não fossem consideradas qualificadas para outra coisa que não fosse parir e cuidar da casa e do marido, os seus textos, inicialmente escassos, passaram a circular. Um número representativo dessa produção limitava-se a “livros de cozinha, manuais de pedagogia e contos recreativos”. A mulher encontrava dificuldades em se fazer ouvir e, os homens, achavam natural, serem seus porta-vozes.
Renata Bomfim
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