10/01/2011

Anna Akhmátova

Até a semana passada eu não conhecia Anna Akhmátova (1889-1966), poeta  filha de um oficial da marinha mercante russa. Confesso que foi o seu retrato que me cativou, lembrou-me a querida Florbela e seus olhos de "violeta macerada". Gostei muito das poesias e espero, assim que folgar, estudar alguns aspectos de sua obra. A antologia poética de Akhmátova, da L&PM Pocket, informa que, antes de ler, a menina Anna já sabia de cor as poesias que eram recitadas por sua irmã, e também nutria grande simpatia pelas pessoas mais pobres. Ela começou a escrever com dezesseis anos (1905) e seu nome verdadeiro é Anna Andréivna Gorienko, mas para não entrar em conflito com seu pai, que desaprovava a sua escrita e morria de medo de ser envergonhado pela filha, adotou o sobrenome da avó. Anna ingressou na escola de Direito em um colégio para meninas, mas abandonou e logo depois ingressou em um curso de História Literária. Casou-se e o marido criou uma revista literária onde ela publicaria no final de 1906. Em 1908 enfrenta uma crise existencial e escapa por pouco do suicidio, desde então, entregou-se a viajar pela Africa com o marido. Anna foi amiga do pintor italiano Mondigliani para quem lia seus poemas, ele lhe pintou um belo retrato, acho até que lhe inspirou os pescoços alongados e olhares lânguidos, marca das mulheres de sua obra. Sua poesia confessional e universalizante encontrou o tom ideal com a maturidade da poeta. Em 1917 Anna se separou do marido e casou-se de novo, seu segundo casamento revelou-se um equivoco, tanto que a poeta afirmou que se permanecesse mais tempo casada esqueceria como se escreve poesia. Seu segundo marido foi executado pela revolução e ela viu a maioria de seus amigos morrerem assassinados ou por sucicidio. Bem, este é um pequeno fragmento da vida dessa mulher corajosa, cuja obra abarca temas como amor, perda, separação, numa perspectiva social de compaixão e amor ao próximo. Akhmátova dedicou-se a crítica literária e escreveu ensaios, ação que desagradava a muitos outros criticos, mas seu brilhantismo era destaco por muitos.  A poeta morreu em 1966, em Moscou, depois de ter vivenciado grandes conflitos pessoais e perseguições por parte do governo. Seguem dois poemas de Anna Akhmátova:

SEPARAÇÃO

Nem semanas nem meses - anos
levamos nos separando. Eis, finalmente,
o gelo da liberdade verdadeira
e as cinzentas guirlandas na fachada dos templos.

Não mais traições, não mais enganos,
e não me terás mais de ficar ouvindo até o amanhecer,
enquanto flui o riacho das provas
da minha mais perfeita inocência.
(p. 87)

TREZE VERSOS

E finalmente pronunciaste a palavra
não como quem se ajoelha,
mas como quem escapa da prisão
e vê o sagrado dossel das bétulas
através do arco-íris do pranto involuntário.
E à tua volta cantou o silêncio
e um sol muito puro clareou a escuridão
e o mundo por um instante transformou-se
e estranhamente mudou o sabor do vinho.
E até eu, que fora destinada
da palavra divina a ser a assassina,
calei-me, quase com devoção,
para poder prolongar esse instante abençoado.
(p. 117)

Um comentário:

Unknown disse...

Bacaníssimo! Tenho um livro com textos de treze poetas russos, dentre os quais poemas de Anna. São pungentes, fortes, sangrados.