01/05/2014

Letania à serpente ou a nova gênese (Renata Bomfim)


Às mulheres desse novo mundo


O mundo,
Nave? Claustro? Túmulo?
Espaço vazio e nulo,
esteriliza pelo horror, o absurdo.
Vejo as minhas faces
refletidas no espelho de um lago:
Sedutores demônios, súcubos,
Criadores de sortilégios, ― Lilith―
(desejo, sangue, húmus):
Encantamento do Todo,
Alfa, Ômega, 
chegadas, despedidas:
Tudo! tudo! tudo!

Benditas trevas, benditas!
Matéria escura feminina
que preenche e une versos.
O meu corpo, amigo da lua,
forjou um novo gênese,
imaginou novas formas, cores, sons,
Entoou letanias,
pediu à serpente que protegesse Caim.

A queda tornou-se motivo de glória!
―Livra-nos, Senhora,
da luz que cega e separa
por cor, sexo, raça...
Da luz produtora
de putas, santas, freiras e fadas.

Mãe das artes serpentinas,
do prazer e da epifania, ― Kundaline―
Alberga no teu útero sedoso
as tecelãs, as sonhadoras,
as virgens invioladas:
Penélope, Medeia, Salomé,
Cleópatra, Florbela e Renata.

A nova Eva, desbocada e louca,
traz no céu da boca o mel, o fel,
o canto que revive,
o beijo que embriaga,
o feitiço que paralisa,
o veneno que mata...
Traz, no abissal,
(gruta quente e úmida)
o indizível, a pequena morte,
a vida transfigurada.

Estou aqui,
mulher e múltipla!
Exijo o que, pelo desejo,
me pertence:
(Esse e aquele)
O homem, a criança, a mulher,
o bicho, a planta, a mata, 
a pedra, o ar, a água, o espírito,
desamparados e indigentes.
Preciso repovoar o mundo,
dar novos nomes a tudo e,
para Eros, missão precisa:
flechar a si mesmo!

renatabomfim
vitória/es, 7-03-2014

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